O processo
eleitoral no Brasil vai a meio e reduzido a dois candidatos. A surpresa foi
relativa. Os dois que passaram à segunda volta, tão distantes e desequilibrados
nas votações, o que deixa muito pouca margem para reviravoltas, integram
Partidos de campos ideológicos diametralmente opostos. O centro, no Brasil, já
se esvaziou. O País irmão na Língua mantém-se há séculos como uma nação
caracterizada por profundas desigualdades sociais, tão mais evidentes e
chocantes quanto maiores são os avanços civilizacionais nas sociedades
ocidentais com que se relaciona. Estes são os factos, julgo que indiscutíveis.
Os que fazem parte da minha rede de conhecimentos votarão, creio, contra
Bolsonaro mais do que no candidato do PT. Não porque não reconheçam que foi com
Lula e Dilma que o País conheceu o melhor e maior salto qualitativo nas
condições de vida do Povo brasileiro, mas porque não se consideram da
extrema-esquerda. Aliás, ambas as legislaturas destes dois Trabalhistas se revelaram
pouco alinhadas, em termos práticos, com o discurso populista de extrema esquerda:
tudo a toda a gente e os ricos que paguem as crises. E o Povo acabou por não
lhes achar graça e, talvez por isso mesmo, porque governar não pode ser assim.
Nem num País que gera tanta riqueza como o Brasil. E a Venezuela, já agora.
Quanto ao facto de os dois se terem visto a braços com a Justiça, um deles
condenado e preso, relembro que deste lado do Atlântico um concelho tido como o
que tem mais massa crítica entre os recenseados, também elegeu um condenado com
pena cumprida.
Mas voltando ao discurso, desta feita o populista da extrema-direita de
Bolsonaro: este parece não enganar ninguém quanto à violência que promete. E é
isso que se torna verdadeiramente assustador. É que o homem promete acabar
liminarmente com pessoas, executando, expatriando ou usando outra qualquer
forma de desintegração. E como justificação para cortar pela raíz todos os
males. O que para xenófobos nacionalistas e candidatos a elitistas de diversas margens,
os “wanna be” portanto, se justifica pela promessa de se caminhar para uma
espécie de nova ordem. Imaculada, asséptica, próspera... como não existe em
lado nenhum, muito menos em regimes ditatoriais e fascistas. Nesses até podem
mostrar-se fachadas com todos esses adjectivos. Mas para o Povo disso tirar
frutos? Ou seja, para todos?!
É nos momentos de eleições livres e democráticas que esse Povo pode escolher
governantes como Bolsonaro. E, de repente, visto assim de longe e pela lente da
Comunicação Social (e esta, mostra ou cria imagens?) parece que meio-mundo no
Brasil embarca numa espécie de Carnaval fora de horas, disfarçando-se de gente
a quem só a bandidagem - pobres, negros e homossexuais no topo - parece
empatar-lhes as vidinhas. E lá vemos o Povo, aquele que até beneficiou com o
avanço social dos outros tais governos, o mesmo que também gritou “Fora
Temer!”, depois de dizer “Tchau quirida!”, o mesmo Povo - ou será outro Povo? -
que até parece que, tendo os benefícios chegado a ele, escusam de continuar a
chegar aos que vêm depois. Como diziam os outros do lado de cá: “o Povo pá? O
Povo quer dinheiro para comprar um carro novo!” Será este o Povo injustiçado em
nome de quem um dos extremos luta? Ou o Povo que se deixa embalar por quem lhe
sussurra ao ouvido que deixará, imagine-se, de ser Povo?