28.9.21

A Beleza da Democracia

 Começar logo a seguir a eleições uma nova temporada de crónicas que têm leituras políticas (por mais voltas afectivas no estilo do discurso que se lhes dê) é uma rentrée em força que precisa de algum tempo. Anuncio, pois uma crónica longa, um defeito que assumo e que procurarei corrigir sempre que a coisa começar a descambar. Não esquecendo o berço da DianaFm, a quem agradeço mais uma vez a confiança em mim para este espaço semanal, é sobre Évora a reflexão. Ainda assim, qualquer semelhança com a realidade noutro concelho não será mera coincidência.

Da longa e monótona pré-campanha, que nos entrou casa dentro por vários ecrãs, porque a COVID19 ainda ameaçava no espaço mais público, custou-me, para além dos costumeiros prantos apocalípticos e ladainhas de promessas, acompanhadas de “papas e bolos” a que dificilmente se chamarão compromissos; custou-me o perpetuar do comentário a debates de que quem está no poder tem a vida facilitada na campanha. Até se vulgarizou o erudito termo de “incumbentes” e tudo! A sério? Acham mesmo que ser alvo é mais fácil que ser dardo? Acham mesmo que os eleitores se lembram mais depressa do que está melhor (se é que está) do que está menos bem ou pior?

Na verdade, cá pelo burgo, os Partidos que costumam eleger membros para a Câmara ou para as Assembleias até andaram muito entretidos a fazer mais oposição a um Partido da oposição do que ao da governação. O que não deixa de ser bizarro. Marcada pela partida de Jorge Sampaio, tão esperada quanto triste como todos os fins inevitáveis que não desejamos, também esta campanha, local mas a derramar para o tom das redes sociais, se entreteve no concurso do maior “fumo” na manga esquerda dos casacos. O concurso deste pregão do luto pela visibilidade não foi bonito.

Mas foi divertido, em Évora, perceber que, ao fim de oito anos, numa campanha que parecia igual à de há também oito anos (tal a pobreza de novos argumentos que só revelaram incapacidade de mudar, já agora para melhor como prometiam), o actual executivo tenha continuado a tentar colher dividendos, e arriscando-se a pagar juros, do estilo de fazer política do Partido. O resultado demonstrou que, em Évora, os primeiros, os dividendos, ainda valeram e comprovou o que vale usar ervas nas bermas e desanimação cultural para contestar. Argumentário que se mostra ora fértil para fraca oposição, ora infértil para quem quer progresso. Fracos argumentos a contribuir, não para a elevação de uma massa crítica, mas para um ambiente do “quanto pior, melhor” com que se enleiam munícipes.

E estes, os Eborenses, afinal sabem sempre bem o que querem: os munícipes que não votaram deverão ter certamente entendido que quem faz do concelho o que ele é são muito mais os seus habitantes do que quem o governa; os eleitores que votaram para manter quem governa, afinal não se importam com ervas nem desanimação, e preferem quem conhecem para as deixar - às ervas e à desanimação - prosseguir o seu caminho; os cidadãos que votaram para que mudasse, talvez tenham aprendido que o discurso da contestação não se combate com iguais imagens “marteladas” do apocalipse, nem a secundar promessas sem caboucos capazes de sustentar projectos que, às tantas, nem sequer passam de verbos de encher, com pouca vontade que se concretizem (ninguém me desconvence que ser Capital Europeia da Cultura é um deles). Enfim, daqui a quatro anos há mais. Que quem não gostou dos resultados preste muita atenção ao trabalho dos que, na oposição, talvez lhes diminuam o desgosto.

Uma das várias belezas da Democracia, para além do poder do voto para fazer a mudança ou confirmar a satisfação em breve (quatro anos passam a correr), é podermos escolher livremente o lado em que queremos estar. E até militar num Partido pela identificação com os seus princípios e contribuindo para que quem se proponha a praticá-los não os tresleia. E também em Évora se percebeu que o Partido Socialista parece ser uma boa Escola de Democracia, tendo atraído para a sua formação três dos seis candidatos a estas eleições, o que faz dele um grande Partido democrático e, com isso, um imenso alvo em que é fácil acertar. E até, como está visto, que se lhes voltem as costas.

Ter atenção a estes “pormaiores” dá algum trabalho, mas também ninguém disse que isto tudo era fácil. Além de que nem sempre o que é fácil é o melhor, embora pareça e seja muito tentador. Aliás, e para não deixarmos morrer a esperança: o que dá muito trabalho é fazer com que tudo seja simultaneamente o melhor possível e pareça o mais fácil possível. Louvo os Políticos que pensam e fazem assim, porque lá que os há, há.