27.5.14

Atos únicos, fenómenos de massas

Votar, para mim, é um ato solene. Faço-o com a mesma comoção com que oiço o hino. É o meu gesto mínimo e fundamental para honrar a liberdade que outros conquistaram, essa em que vivo há 40 anos e que me dá a honra da participação, pelo menos através do voto, ao eleger quem me represente na gestão do país, nem que seja, como nas eleições de domingo passado, num espaço alargado europeu. Trata-se, intimamente, de um ato institucional muito meu. Quase me apetece estrear uma roupinha nova. Eis se não quando, na minha procura de citações sobre liberdade, respiguei a seguinte frase: "Ser-se livre não é nada fazer, é ser-se o único árbitro daquilo que se faz ou daquilo que se não faz."O autor é um francês (hélas!), filósofo e moralista, do século XVII, Jean de La Bruyère que ficou para a história com apenas uma obra a considerar, mas que acertava aqui em cheio no tema que queria aflorar nesta crónica pós-eleitoral que espelha como o meu dia de reflexão foi muito mais o dia seguinte do que a véspera: poder votar e não o fazer quando já se quis e não se podia.
O número dos que não votam é um fenómeno que começo a considerar de massas. Uma multidão que, a juntar-se aos que nasceram já com a liberdade de voto, não lhe dá o valor que já deram os que sabem o que é não poder votar e que ao fim de 40 anos desistem. Isto em Portugal, que na mais velha democracia do mundo, os EUA a abstenção é há muito um sucesso eleitoral. Um fenómeno que engrossa as massas, pois então… Impossível não o achar, quando a vitória é a abstenção e a população está tão envelhecida. Ora eu que dedico uma parte do meu interesse profissional à literatura e cultura de massas, o que me faz conhecer, no meio do que tem interesse, do piorzinho que por ali anda e que desperta paixões e seguidores aos magotes, até tenho uma visão minimamente compreensiva de quem não vai às urnas, como sói dizer-se. A única coisa que posso fazer é, na minha atividade e nos meus relacionamentos pessoais e sociais, tentar alertar essas pessoas para os benefícios de mudarem essa atitude. Como quando encontro quem sendo um leitor apaixonado de um determinado autor fraquito ou de um tipo de livro insonso, tento, dentro do género e da temática, dar-lhe a experimentar algo melhor, sem que essa experiência lhes destrua nunca o prazer de ler.
É o que parece estar a acontecer com estes não-eleitores. Partindo do princípio que os que são hoje não-eleitores já foram eleitores minimamente convictos, e que o assunto da gestão do bem público por determinadas pessoas em quem a delegamos os desiludiu, deixando-os em casa, é o mesmo que perdermos um bom leitor ainda que de um género de livros que, em termos literários e querendo ser literatura, deixam um bocadito a desejar. Estaria, quem como professor de literatura tem a missão de angariar mais e melhores leitores, a prestar um péssimo serviço à sua profissão e havia que melhorar o estado das coisas para reverter a situação. Felizmente, uma nova geração de excelentes autores (em Portugal mas não só, e alguns dos mais velhos também, não sejamos injustos) vai conseguindo ganhar recém-leitores e inverter esta tendência.
O que parece transparecer deste fenómeno de massas, agora aplicado assim à abstenção, é que ao invés de se pensar em melhorar a imagem, e o conteúdo já agora, da representação que os eleitos significam para os eleitores, o que é função não apenas dos políticos como dos que fazem opinião, haverá uma meia-dúzia a quem interessa que uma imensa maioria fique em casa em dia de eleições. Parece, digo eu.

21.5.14

Assuntos de Câmara - a defesa da água pública não pode esquecer São Manços

Hoje não foi dia de boas notícias em Évora... 
«Perante a informação prestada à Câmara Municipal sobre a rescisão unilateral por parte do POVT do contrato de financiamento para remodelação da rede de águas e esgotos de São Manços, os vereadores do Partido Socialista pronunciam-se declarando:
1.      Independentemente de todas as condições decorrentes de alterações legislativas, processuais ou administrativas que ponham em causa este tipo de programas de financiamento, numa questão de saúde pública e de qualidade de bens públicos como a água e o sistema de esgotos, a posição política de vontade de atuar deve prevalecer;  
2.      o poder político local, aliando-se a todas as instituições que o defendem, valorizam e reforçam (ANMP, ANAFRE, CCDRs, CIMs) deve envidar todos os esforços para que, junto do poder central e das instâncias que gerem os fundos públicos de valorização do território, sejam criadas as condições legislativas, processuais ou administrativas possíveis para a execução de operações que incidem sobre questões de responsabilidade pública da importância que esta remodelação apresenta;
3.      estamos conscientes das dificuldades que ao longo dos últimos anos, em particular desde 2009,  anos de grave crise nacional e internacional, têm sido criadas aos municípios; como tal, sabemos que há janelas de oportunidade que tendo a possibilidade de ser abertas devem ser aproveitadas – foi o que foi feito com esta operação que parecia poder estar debelada em 2011 para uma situação que se despoletou em 2008 -, e também sabemos que muitas vezes estas janelas podem ser entaipadas, como esta foi ao longo destes 4 anos, mas nunca nos conformaremos com a opção de que assim se mantenham, ou se encerrem definitivamente porque não houve vontade ou capacidade de ir à procura de meios para as voltar a abrir.

Assim, os eleitos pelo Partido Socialista na Câmara Municipal, aliados às preocupações dos eleitos e munícipes da União de Freguesias de São Manços e São Vicente do Pigeiro com a situação que se vive em São Manços e que tenderá sempre a agravar-se com o tempo, na senda do que foram os esforços para resolver esta situação, pugnando como já o fizemos anteriormente para que a defesa da água pública passe também por exigirmos que esta seja em qualidade e regularidade, solicitamos que esta operação se mantenha como prioridade nos programas locais e regionais e que sempre que sobre este assunto haja desenvolvimentos sejamos informados atempadamente.»

20.5.14

Europa II

Estarmos na Europa é para a esmagadora maioria dos europeus, uma realidade em segunda mão, já que muito pouco se conhece dela diretamente, a não ser que se seja, ou tenha sido, emigrante, estudante ou viajante. E mesmo assim conhecemos aquele outro lugar da Europa que não o país de origem e não a Europa no seu todo. Falo do contacto não apenas turístico, mas de convivência com pessoas e instituições que podemos conhecer in loco ou que nos visitam e, ainda que neste caso em segunda mão também, são um contacto mais direto do que o feito pelos meios de comunicação de massas que assumem o importante papel de grande janela para o mundo. À falta desse contacto mais direto, podemos ainda assim, e fruto da tecnologia, considerar-nos historicamente privilegiados por podermos ir lá sem sair de casa.
Quando temos a oportunidade de conhecer diretamente essa realidade a que somos estranhos e que nos é estranha, a nossa maneira de nos vermos acaba por ser influenciada. E tantas vezes até melhoramos a imagem que temos de nós próprios, por comparação com o que conhecemos dos outros. Ou, noutro sentido, podemos melhorar aplicando o que vemos de melhor nos outros do que o que temos em nós. Provavelmente, também é por estas e outras que viajar é uma espécie de ritual quase religioso dos nossos tempos ou o sonho dos que, não o conseguindo fazer, transformam a viagem na peregrinação que um dia gostariam de realizar. Certo é que, desses contactos, não são unânimes as opiniões e todos acabamos por ter a nossa própria impressão sobre esse mundo estrangeiro.
Confesso-vos que o outro país que melhor conheço é a França. Não porque à semelhança de uma imensa quantidade de portugueses tivesse estado, eu ou a minha família, emigrada ou refugiada em França (como aconteceu a muitos homens no período da guerra colonial), mas porque os meus estudos de Francês assim me foram levando para aquelas bandas. Fui, no primeiro ano de existência do programa Erasmus, aluna em Bordéus, no tempo em que a bolsa era contabilizada em écus, nome de moeda que acabou por não vingar e dar lugar ao Euro. Já lá tinha ido, a Paris pois então, de excursão, primeiro familiar, depois em grupo de colegas. Mas a experiência daqueles três meses como aluna em França, em que conheci com colegas uma parte do país, e onde voltei a ir, lá está quase como em peregrinação, a Paris, convivendo com outros estudantes europeus, marcou-me de tal maneira que voltar a França é sempre uma espécie de viagem a um lugar de afetos passados que faz com que nos sintamos em casa, ainda que com a ótima sensação de termos ido “arejar”.
O Montesquieu, que nasceu perto de Bordéus e foi morrer a Paris, entre 1689 e 1755, e escreveu as Cartas Persas, obra que eu tinha estudado na faculdade, fez um relato imaginário, em romance epistolar, sobre a visita de dois persas a Paris, durante o reinado de Luís XIV e que vão descrevendo tudo o que veem em Paris, criticando os costumes, as instituições políticas e os abusos da Igreja Católica e do Estado absolutista na França daquela época. Disse também Montesquieu que «As viagens dão uma grande abertura à mente: saímos do círculo de preconceitos do próprio país e não nos sentimos dispostos a assumir aqueles dos estrangeiros.»

Da Europa, neste momento, não recebemos apenas notícias diletantes ou críticas acutilantes do que por lá se vai passando. Temos o direito e a responsabilidade de enviarmos quem, em nossa representação, tenha um papel ativo na legislação e arbitragem do que, como um conjunto de nações convencionalmente unidas, pode influenciar a vida própria de cada uma delas. Sem perder a noção da especificidade de cada árvore, por lá se vai gerindo a floresta de que fazemos parte, desejando que o que for decidido e implementado em prol de todos também nos possa beneficiar. No próximo domingo é sobre este assunto que poderemos ter uma palavra a dizer e a influenciar, através do voto, o rumo desta união de países. E só com uma expressão significativa da nossa vontade e empenho pelo bom funcionamento desta instância que nos governa teremos a força, ao lado dos nossos concidadãos, estrangeiros mas afins, de exigir da Europa o que exigimos de Portugal ou do concelho em que vivemos. Afinal, tudo pode passar a ser uma questão de escala.

13.5.14

Europa I

Começo desde já com uma citação: «Hoje que tanto se fala em crise, quem não vê que, por toda a Europa, uma crise financeira está minando as nacionalidades? É disso que há-de vir a dissolução. Quando os meios faltarem e um dia se perderem as fortunas nacionais, o regime estabelecido cairá para deixar o campo livre ao novo mundo económico.» Não a citação não é de hoje nem de ontem. É do século XIX e escreveu-a Eça de Queiroz no jornal Distrito de Évora, onde o génio de criador terá seguramente influenciado o de analista político.
Tenho pena se nesta campanha para a eleição de eurodeputados, e posterior escolha do presidente da Comissão Europeia, não se aproveitar a oportunidade para se falar às pessoas da Europa em termos históricos. As campanhas têm de ser momentos de esclarecimento e não apenas de ataques a políticas que não se conseguem desmascarar numa dúzia de páginas de discurso que, ainda assim, é o que depois conta nos barómetros dos “fazedores de opinião”, refletindo-se em sondagens e, expetavelmente, nos resultados eleitorais.
Também já sabemos que as citações literárias, tão apreciadas para o discurso solene, quando tocam estas questões políticas, e não são programáticas como quando saem da pena de autores definitivamente engajados em partidos políticos, podem servir uma coisa e o seu contrário. “São flores, senhor, são flores”, perdoem-me a paródia…
Também não será numa, ou numa série de crónicas, que se conseguirá “explicar” a Europa sem se cair num enciclopedismo de bolso. Ainda assim, vou nesta primeira crónica, de duas, falar-vos do que me parece relevante saber sobre a Europa, provavelmente algo muito vago, impreciso e legitimamente sujeito à crítica de especialistas, mas que talvez vos dê curiosidade de aprofundar. Ora cá vai, então.  
A Europa, mais precisamente a Grécia, é considerada o berço da cultura ocidental na Antiguidade, espaço temporal que vai da invenção da escrita à queda do Império Romano. A partir do século XVI, consolidadas as viagens de descoberta do Novo Mundo, com o início do colonialismo e até ao século XX, as nações europeias controlaram em vários momentos grande parte do resto do Mundo. E as duas guerras mundiais foram centradas na Europa, facto que terá contribuído também para um declínio do domínio da Europa Ocidental na política e economia mundial a partir de meados do século XX, quando os Estados Unidos da América e a União Soviética ganharam maior protagonismo, no que ficou conhecido como a Guerra Fria. A vontade de evitar outra guerra acelerou o processo de integração europeia e levou à formação do Conselho Europeu e da União Europeia na Europa Ocidental, que desde a queda do Muro de Berlim e do fim da União Soviética, em 1991, têm vindo a expandir-se para o leste.
O fator antiguidade é, ou deve ser, considerado muito importante em vários níveis da Humanidade, desde a história de um indivíduo inserido numa família, ao de uma nação, com uma história que a gerou. E os movimentos do tempo, sendo dinâmicos, são muitas vezes cíclicos e “as coisas” parecem repetir-se. Mas nunca exatamente da mesma maneira, quando conhecemos e aprendemos com o passado que, ao invés de nos prender, deve libertar-nos para andarmos para a frente e promovermos alterações, adaptações, num complexo sistema que tende a constituir aquilo que, de forma abrangente, só encontro mais concentrado na palavra Civilização. E é a partir das conquistas civilizacionais, portadores do bem-estar do Homem, que devemos construir caminho e evitar retrocessos. 

Termino com outra citação: «Se eu soubesse alguma coisa que me fosse útil e que fosse prejudicial à minha família, expulsá-la-ia do meu espírito. Se eu soubesse alguma coisa útil à minha família que não o fosse à minha pátria, tentaria esquecê-la. Se eu soubesse alguma coisa útil à minha pátria que fosse prejudicial à Europa, ou que fosse útil à Europa e prejudicial ao género humano, considerá-la-ia um crime». Disse-o Montesquieu na França de 1817, o mesmo filósofo que não entendia a democracia sem a igualdade, conceito, este último, que agora substituímos, de pés mais assentes na terra, por solidariedade.

7.5.14

Assuntos de Câmara - A água e a autonomia do poder local

Hoje foi aprovada em Reunião Pública de Câmara uma moção com o título «Defender a Água Pública: as Leis Devem Respeitar a Autonomia do Poder Local Democrática», com a única abstenção do vereador do PSD/CDS.
Depois de algumas sugestões de alterações sugeridas por nós, vereadores eleitos pelo PS em Évora, nomeadamente as que diziam respeito a declarações sempre especulativas e de tom apocalíptico ligando o eventual aumento dos preços a uma privatização que ainda se pode evitar e não a uma garantia de recuperação do custo real destes bens e serviços de forma a torná-los sustentáveis garantindo-lhes a qualidade, deliberou-se:

«1. Denunciar que aquelas leis [nº10/2014 e 12/2014, de 6 de março] são atentatórias da autonomia do Poder Local Democrático a qual é garantida pela Constituição da República Portuguesa e, nesse sentido, apoiar as diligências da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP) para pedir a sua inconstitucionalidade;
2. Alertar os utentes daqueles serviços públicos para o facto de aquelas leis poderem significar mais do que uma garantia da sustentabilidade do sistema, um passo para a futura privatização da água, do saneamento e dos lixos e, em consequência, eventuais aumentos brutais nos tarifários de forma a, eventualmente, garantir futuros negócios privados com avultados lucros;
3. Opor-se a qualquer tentativa de privatização destes serviços públicos, adaptar os seus serviços de água, saneamento e lixos, incluindo os regulamentos e tarifários, procurando salvaguardar o interesse público e garantir que a Câmara Municipal tudo fará para defender a propriedade e gestão públicas destes serviços.»

A nossa declaração de voto foi a seguinte:

«Os vereadores do Partido Socialista opõem-se à privatização da água e dos outros serviços públicos, nomeadamente o saneamento e o tratamento de resíduos, que estão em causa nesta moção. Mas para os vereadores do Partido Socialista defender a água pública é muito mais do que falar do seu preço e da sua eventual privatização. É também, e sobretudo, garantir um fornecimento de água em qualidade e regularidade, assim como garantir a sustentabilidade neste sector, onde se incluem água, saneamento e resíduos.»

  

6.5.14

Alerta vermelho para as escolas nas freguesias rurais de Évora

Sete. Não, não é do número mágico que vos venho falar hoje, mas não deixa de ser simbólico. Este é o número de escolas primárias (chamemos-lhe assim porque foi assim que nasceram lá no passado onde estão ainda a servir o futuro), escolas da esmagadora maioria das oito reagrupadas freguesias rurais do concelho (antes 11), e de que se anuncia o encerramento. Esta é uma notícia que a ser verdade, já que nos vamos habituando aos truques deste governo dos grandes disparates que depois são só disparates, é uma notícia que não se pode aceitar de cravo ao peito e braços cruzados. Este é o momento em que os que recusam liminar e demagogicamente as inevitabilidades se têm de lançar ao trabalho, aquilo que todos os políticos sérios defendem como valor primeiro, mas de que alguns se apropriam como slogan eleitoralista. É que não basta pôr faixas negras no gradeamento de escolas a esvaziarem-se, nem gritar contra outros poderes pelo simples exercício de contestação, tantas vezes demonstração de um poder por si próprio e não pelo resultado que se deseja obter. É que como dizia um político francês desaparecido há 100 anos, ativo republicano e enorme referência na história da defesa dos socialmente mais frágeis, Jean Jaurès, «não se ensina aquilo que se quer; ensina-se e só se pode ensinar aquilo que se é.» E lutar contra o encerramento de escolas em aldeias dispersas e distantes do centro urbano é todo um trabalho que percorri durante quatro anos e que, mais do que a minha vontade feita de conceitos que estudei, me transformou pessoal e profundamente na minha vida política, onde se exerce a “arte do possível” (esta uma expressão de Bismarck, outro estadista, prussiano, de enorme importância na diplomacia europeia do século XIX). Oiçam-me, pois, com a paciência que vos peço, por mais alguns minutos.
Muitos estudos nos dizem que as crianças têm de socializar para crescerem melhor. Outros há que defendem, nos primeiros anos de aprendizagem do elementar – ler, escrever e contar –, que o ambiente familiar e mais restrito também lhe é benéfico. No limite, e tratando-se de ciências humanas e sociais as que estudam estas matérias, caberá avaliar caso a caso os modelos de aplicação para um coletivo que se propõem e decidir. Há depois, na gestão do bem público, outros valores a ponderar, sendo que em educação, e em política de uma forma geral, é em investimento e não em despesa que nos devemos concentrar. Em educação não há luxos e os negócios não são, nem deviam ser, para ela chamados. Foi assim que, em 2010, aquando do primeiro e único encerramento de escolas; estavam propostas mais mas só uma fechou e não foi por falta de crianças na aldeia mas porque os pais não as inscreveram, com toda a legitimidade, porque as queriam perto do local de trabalho ou de outros familiares que lhes dessem apoio, argumento tão válido para aquelas famílias que as queriam manter na escola da aldeia. E foi a única escola que fechou, já a atual legislação estava em vigor, no mandato em que fui vereadora com responsabilidades na educação.
Um trabalho que prosseguiu com o trabalho enorme de um conselho municipal de educação, voluntário e cheio de vontade, que se desdobrou não apenas em discussões ideológicas, já que ele era bem plural também nesse campo, mas em deslocações às comunidades educativas em risco pelo legislado, onde os presidentes de Junta, respetivos executivos e membros de assembleia são, ao lado dos pais, encarregados de educação, pessoal não docente e docentes, uma voz importante a escutar com muita atenção. Um trabalho que modificou aqueles que, como eu própria, apenas conheciam um lado da questão, o tal da socialização das crianças, embora soubesse já que aquelas escolas eram, e ainda devem ser, os lugares mais acolhedores, alguns mesmo quando comparados com novos edifícios urbanos e modernos igualmente atrativos, para neles se poder aprender a crescer. O investimento municipal nas escolas rurais, por parte da Câmara e das Juntas de Freguesia, era uma evidência inegável como contributo para o bom ambiente de ensino-aprendizagem.
Os problemas que o encerramento da única escola levanta aos habitantes de uma aldeia, onde se já há poucas crianças quanto menos infraestruturas que as apoiem existirem menos haverá, são bem maiores do que os que imaginamos quando lemos trabalhos científicos com todo o rigor que efetivamente têm. Por isso, também, o trabalho de levantamento de razões e confirmação de posições tem de ser consistente, metódico e constante, para que o debate político com os restantes poderes, por ventura decisivos na matéria mas que devem seguir as regras da democracia aplicáveis quer a nível nacional quer local, não se fique pelo esgrimir de argumentos técnicos encontrados de régua e esquadro à distância ou, no outro lado, com ideologias por vezes corporativas outras vezes tão vagas que se tornam igualmente distantes do quotidiano e da vida das pessoas que em nós políticos depositam a confiança num compromisso de as representar.
E é por isso que eu repito e reafirmo que fechar escolas não é uma notícia que se pode aceitar de cravo ao peito e braços cruzados.