Com o
resultado, do nível nacional, para o Orçamento Participativo ficámos
esclarecidos quanto aos lobbies relevantes
para parte do povo português, a mais empenhada em contribuir para o bem-estar
do próximo: os pró e anti touradas e os lambareiros de doces. Tudo isto terá
muito a ver com o que grande parte das pessoas, interessadas em ouvir discutir
também assuntos sérios, consome na TV. E nem precisamos de sair do canal
público para termos dois casos exemplares: o Prós e Contras, com fim anunciado
e uma pontinha de esperança minha de que não volte, seja naquele formato ou
pior ainda; e o Fronteiras XXI. Ora foi precisamente do primeiro destes programas
que saiu a mais recente fonte de troca de “piropos” nas redes sociais ao bom
estilo português. Ou seja, aquele que mistura em si, para as medidas públicas
que lhe parecem pessoal e vagamente injustas, uma forma de contestação copiada
do oprimido pelos 48 anos de ditadura que continua a ser promovida por certas
forças, e a igual forte convicção de que o que era mesmo preciso era outro
Salazar para endireitar o País.
Pois o
assunto gira à volta da intervenção de alguém que julga que a sociedade
portuguesa já está apta a que se dê a cara e o nome quando se fala em público,
sem esborratar ou distorcer a identidade, da vida íntima do cidadão comum. Está
visto que não. Que ainda só vamos no patamar de falar destas coisas sobre as
figuras mesmo públicas, as que ganham parte da sua vida com essa exposição.
Quem queira ousar equiparar-se, toma lá com a chacota e o enxovalhamento para
aprenderes que isso é terreno onde é reservado o direito de admissão! Bom, mas
adiante, que o assunto não mete bolinha vermelha no canto superior direito do
ecrã, desses falarei noutra altura, já que o assunto de hoje trata do
simples...beijo!
A banalização
do beijo em certas culturas, nomeadamente na popular portuguesa, é uma
realidade. E eu, esclareça-se já, sou contra. Não militantemente para não
passar por malcriada ou para não criar desgostos aos de quem gosto muito, e
também a quem, naturalmente, não retribuo violentada o beijo, e sim como
reacção natural porque recíproca. Mas também, em muitos casos, sobretudo nos
que não quero passar por malcriada, sei bem que a nossa cultura, bem impregnada
do caldo judaico-cristão, tem muito de Judas em várias reacções. Há várias
situações em que seria um favor a todas as partes evitar-se essa manifestação
de afecto. Era isso e, já agora mas por motivos diferentes, conseguir passar
pelo PR sem ter de apanhar uma beijoca folclórica em que as suas aparições
populares já descambaram. Beijos transformados em pechisbeque, só jajão. Sendo
contra a banalização do beijo, admito a violência que será para as crianças
obrigar a dar um beijo, quando ainda estão há tão pouco tempo impregnadas do
boião de cultura que mistura pró e anti touradas com lambarices. Não me lembro
se alguma vez violentei assim os meus filhos, sempre que os ensinei a retribuir
cumprimentos ou a cumprimentar de cara alegre e bons modos as pessoas ao pé de
quem chegavam. Se o fiz, não devo ter certamente promovido o afecto das
“minhas” crianças por tais pessoas.
Quanto aos que se encanitaram com a intervenção na TV
do outro senhor que usou um exemplo extremo, como é de resto tudo o que é
violento, só me resta lamentar não se ter percebido a sua mensagem, certamente
muito desfasada das práticas culturais portuguesas. E pelo que de triste há em
obrigar a ter afectos que não são conquistados por uma saudável e bem sólida
relação cordial, que é a que vem do coração. Até a Capuchinho Vermelho que
gostava tanto da Avó desconfia daquela velhota estranha que se faz passar por
ela. E tinha razão!