29.1.13

REPRESENTAR

Numa semana em que tive oportunidade de trocar algumas impressões com um filósofo catalão que exerce há 30 anos cargos políticos e em que a proposta para a PAC dirigida pelo eurodeputado Capoulas Santos passou com grande sucesso na primeira instância do Parlamento Europeu, gostava de vos falar sobre esta questão de os eleitos representarem os que os elegem. Ou não.

Que a política nunca foi, para alguns, considerada atividade de prestígio, foi algo com que sempre convivi por metade das minhas costelas pertencerem a uma família de políticos. Mas também sei que, até por aqueles que conheci, o respeito por quem o era se manifestava de diferentes formas. Atualmente parece-me mais do que evidente que há uma esmagadora maioria de cidadãos que tem pelos políticos um enorme desprezo, sejam eles de que quadrante forem. Isso mesmo constatava o tal filósofo vindo de Espanha, até a propósito do cartaz nas manifestações dos indignados em Madrid em que se podia ler «Demisión! No nos representan!». Esta crise também da representação interpretei-a eu com ele, em conversa amena, e acabámos por concordar, dizendo-lhe que agora que exercia um cargo de poder para o qual fui democraticamente eleita, quando mais do que nunca tenho convivido com toda a espécie de cidadãos, de facto tenho conhecido muitos que são empreendedores, trabalhadores, cumpridores, mentirosos, oportunistas, egoístas e, como tal, tenho que reconhecer que no mundo dos eleitos há-os a representar todas as espécies.

Dir-me-ão que os políticos deverão ser exemplares e eu concordo plenamente. Faço até por isso todos os dias. Mas o que é certo é que os políticos são homens e mulheres a quem tantas vezes é mais fácil, pela visibilidade que têm, encontrar o defeito do que louvar o feito. É mais fácil inviabilizar uma boa ideia ou medida do que colaborar para a melhorar ainda mais ou, atá apenas, viabilizá-la. Sobretudo quando se trata de unir pessoas que representando ideologias diferentes têm, à partida, como missão trabalhar para que tudo corra bem ou o melhor possível, servindo o interesse público. Digo à partida, claro, porque os caminhos divergem tanto que, muitas das vezes, desconfiamos da sua intencionalidade em servirem esse bem-estar…

O caso do trabalho do eurodeputado Capoulas Santos, eleito por nós para trabalhar também em defesa do interesse nacional mas com a dura tarefa de coordenar uma comissão que tem também de zelar pelo interesse europeu, é de facto exemplar. Ele cumpriu a sua parte, ouviu, coordenou e conciliou interesses. Fiquemos à espera que aqueles que têm o poder de viabilizar este bom trabalho façam também o seu. Falo daqueles que representando os diferentes governos de cada país da comunidade europeia têm agora de apreciar e votar a proposta desta nova Política Agrícola Comum. Eu cá fiquei muito orgulhosa de ter ajudado a eleger um eurodeputado que, de facto, me representa na União Europeia.

17.1.13

DISPENSAR

A semana passada correu a notícia das próximas medidas que o FMI aconselha numa longa lista, sempre com boa receção, ao governo deste nosso pequeno País tão grande em dificuldades e tão profundo em casos, se calhar a servir de exemplo a outros Países da velha Europa. Dispensar professores é uma das linhas da dita lista.

Concentremo-nos no verbo dispensar e em todos os seus significados, já que todos esses dispensados são profissionais formados exatamente para essas funções e não para outras quaisquer, logo importa saber em que se transformarão por força de eventuais novas funções. Dispensar significa “isentar” ou “desobrigar de”, significa também “prescindir” ou “não precisar de”, e significa ainda dar” ou “distribuir”.

Se o Governo seguir à risca esta linha da lista – bem sei que parece estarmos perante um jogo daqueles eletrónicos, tipo Pacman, em que uma bolinha comilona come em caminhos estreitos bolinhas sossegadas – o Estado estará, ao dispensar professores (porquê professores, ainda estou para perceber melhor, mas adiante, isto fica para uma próxima), a desobrigá-los de continuarem a ensinar. Todo e qualquer investimento feito na formação de professores terá, pois, sido dinheiro deitado à rua. A menos que, se esteja a pensar que deixe de ser o Estado a contratá-los e que por isso se desobrigue de ter nos seus quadros professores em número suficiente para ensinar os cidadãos e sejam as empresas a tomar em mãos grande parte desse assunto. Talvez seja isto, sim…

Se o Estado decidir que não vai precisar de professores deverá assumir, no mínimo, que não está nem aí preocupado em investir em Educação numa perspetiva nacional, dando igual oportunidade de, do Minho ao Algarve, as crianças e jovens portugueses estarem equiparados nos objetivos e metas de conhecimento e aprendizagem. A menos que, repito, se esteja a pensar que deixe de ser o Estado a contratá-los e que por isso não precise de ter nos seus quadros professores em número suficiente para ensinar os cidadãos e sejam as empresas a tomar em mãos grande parte desse assunto. Talvez seja isto, sim…

Se o Governo dispensar professores do Estado dando-os a ou distribuindo-os por sabe-se lá quem e como, estes deixarão de ser funcionários públicos, desobrigando-se desta feita, se calhar, de cumprir aqueles dez princípios que tanto prezo da carta ética da administração pública, em que o primeiro princípio nos lembra logo que os funcionários se encontram ao serviço exclusivo da comunidade e dos cidadãos, prevalecendo sempre o interesse público sobre os interesses particulares ou de grupo. A menos que, insisto, se esteja a pensar que ao deixar de ser o Estado a contratá-los, não precise de ter nos seus quadros professores em número suficiente para ensinar os cidadãos e sejam as empresas a tomar em mãos o que se tornará então o Negócio da Educação. Talvez seja isto, sim…

Ah! Já percebi! É que o negócio é sempre uma coisa muito mais rentável do que a paixão… desde que não feche, claro!

8.1.13

RECOMEÇAR

Sempre me disse mais a noite da passagem do ano do que a noite de Natal. O facto de, em princípio, estarmos todos ao mesmo tempo numa mesma longitude a marcar o início de algo provoca-me sempre um turbilhão de pensamentos, sentimentos e emoções. Pensar nos que estão, nos que partiram, no que está a ser tão bom, no que está a ser pior mas que há-de melhorar, se depender só de mim, enfim, parece-me sempre ser aquele um momento de recomeçar.

Recomeçar não quer dizer apagar tudo o que vem de trás, não senhor. Até porque isso quereria dizer que nem com os erros, partindo do princípio que seriam esses que queríamos apagar, aprendemos. Recomeçar, diz-me a mim a palavra, é voltar a pegar no que estávamos a fazer e que por qualquer razão interrompemos, como se interrompe um ano para começar outro, mesmo se o Tempo, independentemente de todos estes artifícios de calendário, continua inevitavelmente a passar. Contra esta inevitabilidade cortamo-lo às fatias, ao Tempo, conforme nos dá jeito e sem desajeitar muito a vida dos outros, para o irmos gerindo. E esta fatia grande de um ano inteirinho por estrear deixa-nos expetantes sobretudo quando se ouvem, quase em uníssono, vozes que prenunciam coisas menos boas.

Mas também com as vozes vou podendo bem, já que tantas vezes as coisas e os seus contrários entram numa lógica em que parecem todas querer encaminhar-se para um bom desfecho. Parecem. O exercício que nos poderemos obrigar a fazer é recomeçar por ler nas entrelinhas de todas as previsões, análises, profecias, pensar nas causas das coisas, procurar todas as informações, olhar para gestos e atitudes de concidadãos com olhos de ver, discutir com quem possa dar-nos mais uma informação ou um ponto de vista diferente mas igualmente fruto de reflexão.

Por vezes sinto que se há utilidade na formação de leitores literários, ou seja dos que entram no mundo da leitura pela literatura (e digo utilidade porque a literatura, como toda a arte não precisa que lhe encontrem uma utilidade), é nunca dar como unívoca uma mensagem traduzida em linguagem, neste caso verbal. A realidade transmitida pelo discurso, ou construída pelo discurso como é o mundo criado pela ficção ou pela poesia, é sempre equívoca, já que plural, na leitura dos significados que encerra. Ler o mundo, o real, o comezinho de todos os dias, que nos entra em catadupas pelos canais de TV, através dos discursos – dos discursos dos repórteres, dos discursos dos políticos, dos discursos dos comentadores, dos discursos dos especialistas – é sempre ir tendo apenas lados de um objeto muito mais pluridimensional que é a vida das pessoas ou é, também, o programa dos que gerem o país – os da posição e os da oposição – já que contrapoder também é poder…

Antes de lançarmos mão da reação mais primária da revolta perante um discurso sobre a vida tão descorçoante – e como essa é uma reação tão natural e fácil para qualquer um de nós comum mortal! – não deveremos antes pensar se tudo aquilo que nos faz reagir assim não seria previsível, se aquilo de que nos queixamos agora não é aquilo de que se queixam desde há muito outros (e que alguns até foram tentando remediar e não aumentar o número de queixosos), se o que agora para alguns serve de remédio, não foi já apontado pelos mesmos como veneno? Enfim, pensarmos que não foi por acaso que chegámos assim e aqui a 2013, não apenas por causa de uns ou de outros mas, se calhar, de uns e de outros. Erros de governação, opções menos felizes, condutas menos solidárias e logo menos próprias de atos de cidadania, podem acontecer a quem age e a quem atua, ou então a quem se deixa levar por gestos menos pensados. Importa é saber que todos e todas poderemos recomeçar… e termos aprendido com esses erros. Vamos lá aprender connosco próprios, já que em princípio somos aqueles com quem lidamos em primeiro lugar em cada dia que nasce!