Parece
que a mulher de um presidente dos EUA, não a actual e jovem Melânia mas a
senhora Eleanor Roosevelt, teria sido autora de uma afirmação sobre mulheres de
que muito gosto. Terá dito que as mulheres são como as saquetas de chá e que só
quando metidas em água quente revelam o quão fortes são. Gosto, sobretudo,
porque substituiria bem, hoje em dia, mulher por ser humano e a frase
continuaria igualmente rica de significado. Ora, a autora parece não ter sido
Eleanor, tratar-se-ia antes de um ditado irlandês de meados do século XIX, e
que terá sido outra primeira-dama norte-americana, Hillary Clinton, quem lha
atribuiu nos anos 90, sabe-se lá já com que intenções de valorizar a
importância das “consortes” da República. Seja como for, é conversa equívoca
como uma bela metáfora, esta comparação que não estará isenta de tresleituras
mas está certamente pejada de boas imagens.
Nesta
época em que tantos e tantas vão a banhos, normalmente procurando águas cálidas,
a imagem aparentemente frívola e discriminatória, ainda que cheia de
delicadeza, leva-me a encerrar este ano de crónicas com um tema que, mais do
que acentuar uma geral questão de género, trata a necessidade do ser para além
do parecer. Curiosamente, a ligação deste par ser/parecer é muito colada, quase
universalmente e ao longo da História, ao género feminino, até por quem luta
militantemente nas questões feministas. Afirmo-o com à-vontade, pela
convivência que tenho com uma geração que, nascida e criada em ambiente não discriminatório
de género, não perde o seu tempo, na sua maioria, com essa necessidade
constante de distinção e afirmação de género, o que bem pode agradecer às
gerações anteriores.
A
frase traz-me o gosto no desgosto das generalizações tendenciosas. Ou seja,
generalizarmos quando nos dá jeito e reclamarmos o “cada caso é um caso”
quando...nos dá jeito, também. Enfim, padrões e padronizações de que nenhum de
nós está isento nos vários gestos do dia-a-dia e que só na casmurrice ganham
contornos de ridículo. A casmurrice é, aliás, recorrente em vários graus e
esferas. “Casmurrice” aqui entendida literalmente como obstinação, já “esfera” considerada
figuradamente como extensão da autoridade ou poder, dos talentos ou das
atribuições.
A
generalização da placidez feminina desgosta-me tanto como a generalização do
profissionalismo, da capacidade de mobilização, da determinação (que pode
confundir-se sempre com a dita casmurrice) ou da competência, todos atribuídos
a elementos dessa esfera, aqui no outro sentido literal para além do sólido
geométrico, onde a esfera se perfila ao lado do pilar, que é a condição de ser
mulher. Ou mãe, ou esposa ou o que quer que seja que tem, no correspondente
outro género, igual valor distintivo para o que quer que seja. Enfim, o que é
possível encontrar numa mente aberta, que olha o futuro de frente e não com os
olhos na nuca, sempre com medo de quem está à volta ou atrás e possa vir
reclamar também a sua participação nesse futuro.
Gosto
de poder ser comparada, ao lado dos homens, mulheres e transgéneros, todos sem
transtornos de identidade que façam do género o argumento mais forte que
arrasta, como velhas latas atadas entre si por um cordel, qualquer outra
qualidade ou característica assexuada e muito mais valiosa; gosto de ser
comparada com um delicado saquinho de chá, capaz de revelar todo o seu
esplendor quando tem de ser. “Capaz” é uma palavra sem género e é por isso que
eu gosto de me rodear dos que são capazes. E qualquer ser humano (generalizo) é
tão capaz, por ser ser e ser humano, de despertar em nós admiração com
destacadas boas características muito suas (individualizo) em que demonstra,
quase de forma natural e inconsciente, o que de melhor tem para dar. Essas são
o que dão sentido à Vida. Pelo menos à minha!