13.7.21

O Verão, o vírus e a vacina

É a última crónica da temporada e a próxima só regressa, em princípio, depois das eleições autárquicas. Talvez nesse regresso, já no Outono, a chamada imunidade de grupo esteja alcançada, tal como poderá estar aberto caminho a que, em cada concelho, as queixas ou louvores dos cidadãos tenham a força de os transformar em eleitores, com resultados a terem as respectivas leituras.

O País (como o resto do Mundo) está transformado num laboratório de experiências sociais para se encontrar o caminho do fim de uma pandemia viral, com a ajuda de uma vacina, o fruto primor da Ciência. Uma dessas experiências parece ter passado por gerir a nível nacional com o modelo do nível local: o da proximidade, o de ouvir as pessoas, as agremiações, as forças vivas da terra. O resultado está à vista, muito mais como consequência da novidade pandémica e dificuldades em gerir as novidades sem sequer poder recorrer ao “benchmarking” porque estamos todos na mesma. E esse resultado parece decalcado da lição que nos dá a história tradicional clássica de “O velho, o rapaz e o burro”, com experiências que mudam de 15 em 15 dias e não agradam todos ao ponto de parecer que não agradam ninguém. Porque, aos microfones da maior parte da Comunicação Social, o volume das queixas está muitos decibéis acima do dos elogios. O que, aliás, os conselhos dos pedagogos já concluíram ser o caminho errado para educar com sucesso… mas é o que ainda temos.

Partindo deste paralelismo que usa o mesmo princípio de governar o País como quem governa uma Freguesia, e reforço que considerando o paralelismo numa experiência laboratorial por força das circunstâncias, julgo que se perceberá a falácia do discurso da proximidade de fazer como querem “os de cá”; tal como se perceberá que os problemas de comunicação estão muitas vezes mais no canal e no destinatário do que no emissor ou na mensagem. O canal cujo interesse é procurar mais destinatários, o destinatário que não é nem simples, nem unânime, nem abnegado ao ponto de perceber de que nem sempre o que me serve a mim serve a outro ou a todos. Revela-se assim o desconhecimento generalizado do que é a missão política como prática de fazer o possível quando o ideal é por definição distante e inacessível: o que tem mais possibilidades de servir a todos, poderá servir-me melhor a mim também. Tudo isto nem sempre, nem nunca. Como tanto o que diga respeito ao ser humano e à sociedade.

Posto isto, desejo aos ouvintes da DianaFm um bom Verão, que evitem o vírus da desinformação e da demagogia que têm vagas mais expressivas em alturas eleitorais, e aos mais jovens que agarrem a oportunidade da vacina como quem agarra o Verão com a força juvenil de que quem já não o é guarda como as melhores memórias.

Até à próxima. 

6.7.21

Joe vs Zé

 Com a prisão de Berardo, de quem todos já suspeitávamos tratar-se de uma personagem que desliza bem no palco de uma certa vida com glamour: um tipo com bom gosto para a Arte, para o vinho e para o uso do muito dinheiro, num estilo à talentoso Mr. Ripley; com a sua prisão, os despojos morais disputam-se entre quem concorre ao lugar de quem mais contribuiu para a queda do pano. Entre os deputados da Nação que, em comissão parlamentar, optaram pelo guião cómico, e o juiz Carlos Alexandre que armou a sua já habitual cena de policial em canal de TV cabo, as câmaras sedentas de filmaços andaram numa fona e recolheram alegria aos molhos.


Lembram-se, talvez, de um sketch dos Gato Fedorento em que “Fuck you” seria impropério mal-educado na boca de um pobre, mas excêntrico e muito giro dito por um rico; e de um “minicaixotinho” que se tornava numa obra de arte interativa com valor na Bolsa. Alguns, muito poucos, tiravam já a pinta ao ambiente onde todos se pelavam por ir dar um pezinho de dança e fazer um tchim-tchim. Mas o glamour partilha com a cobiça a vantagem de ofuscar todos, até já só com lantejoulas de pechisbeque usadas com a mesma arrogância com que se usam diamantes, e com a desculpa de que o dinheiro é todo da mesma cor e fica bem no bolso de qualquer um. Quanto mais com Arte, senhores, com Arte! A que dizem que eleva as sensações, as emoções e, em curto-circuito, amolece os corações mesmo diante do glamoroso intrujão que albarda melhor o burro ao costume de quem já está no meio das traficâncias de favores e cifrões.
O curioso, neste último acto de Joe a caminho de voltar a ser Zé, é ele repetir vários enredos ficcionais, ou mirabolantes casos passados da vida real. Faz sobretudo lembrar aquelas histórias passadas nas grandes capitais ocidentais dos loucos anos 20, ou até dos 50, pós-guerras portanto, em que à festa constante das elites, as que podiam beber champanhe ao pequeno-almoço e trincar umas ovas de esturjão antes de aterrar na almofada, se juntavam uns infiltrados capazes de deslumbrar pela sua ousadia em aproveitar as desbundas e ajudar à festa. Ao curioso da repetição junta-se o triste ímpeto dos que, ficando do lado de fora do casino glamoroso, murmuram vendo passar os bólides de que se pudessem faziam o mesmo. É assim que a roda-viva, mesmo que abrande, nunca parará. E que a euforia de pseudo heróis justiceiros também não ajuda.