28.10.14

Hashtag

Hashtag é uma expressão bastante comum entre os que usam as redes sociais, na Internet. Consiste no uso de uma palavra-chave antecedida pelo símbolo do cardinal, aquele que parece a grelha de jogarmos ao velhinho jogo-do-galo. Tags são as palavras-chave, ou seja as mais relevantes, ou as que associamos a uma informação, tópico ou discussão que se deseja realçar de forma explícita. Os hashtags são utilizados para categorizar os conteúdos publicados nas redes sociais, ou seja, criam uma interação dinâmica do conteúdo com os que interagem na rede social, alertando-os para o que poderá interessá-los no respetivo assunto publicado. Surgiram e tornaram-se populares no Twitter, que categorizava os assuntos mais populares do momento criando-se uma espécie de top a que se chamou trending topics.
Os utentes desta rede utilizam os hashtags para justamente classificar o que publicam, e que deve ter menos de 140 caracteres, em assuntos específicos. É uma espécie de "arquivo" ou "pasta" para organizar os conteúdos no que é o imenso mundo da comunicação pela Internet e são já, não apenas uma ferramenta para organizar os conteúdos publicados, como se transformaram em "armas publicitárias" entre as empresas e instituições que utilizam as redes sociais como meio de comunicação e marketing. Devido ao seu uso difundido, o conceito foi adicionado ao dicionário da língua inglesa Oxford, só em junho deste ano e também passou a designar o próprio símbolo do cardinal, quando utilizado desta maneira.
Trazer o hashtag a esta crónica veio a propósito da etiquetagem que é comum fazer-se das pessoas e que tem, depois, reações no sentido contrário igualmente extremistas. Eu explico. Costumamos enfiar as pessoas em sacos e etiquetá-los assim: os funcionários públicos, os desempregados, os banqueiros, os políticos, os jovens, os idosos, os médicos, os gordos, os baixos, os de direita e os de esquerda, etc., etc. quando nos dá jeito. Sobretudo, para dizer mal dos próprios ou contestar alguma coisa em seu favor. Já no extremo oposto, surge muitas vezes a expressão “cada caso é um caso” que, a bem dizer também me causa algum desconforto, já que percebendo muito bem o que se entende por dar a cada caso uma atenção especial, o que não é a mesma coisa, se cada caso fosse realmente um caso não havia, por exemplo, ciência. E também, por isso, nas ciências humanas e sociais, convencionalmente menos exatas, as generalizações devem acontecer na sequência de estudos suficientemente abrangentes, com amostras bastante alargadas, para que as exceções à regra sejam isso mesmo e se entenda que quando se age em função de um grupo, há particularidades que podem ficar para outro plano. Aliás, se como também é comum dizerem os que sentem alguma afinidade entre si, apesar das diferenças, que “é muito mais o que nos une do que o que nos separa”, então é porque reconhecemos que as fronteiras são lugares fluidos e que, por vezes, há que dizer de forma clara e esclarecedora, o que nos distingue e o que nos aproxima. Ou por outra, às vezes não é preciso dizer nada, pois ao fim de algum tempo de contacto e convivência tudo fica esclarecido. Preciso é dar tempo ao tempo, coisa que parece mais do poema de um fado do que da vida de nós todos comuns mortais. É deixá-los andar. 

21.10.14

Auctoritas

Hoje apeteceu-me o latim. Eu sei, eu sei que isto é coisa lida e escrita por uma infinitesimal  parcela da população mundial, nas universidades e nos seminários, de que ainda ouvimos por vezes ecos nas barras dos tribunais. Mas isto também não quer dizer que a cronista, uma quase leiga nesta matéria, possa pensar que as e os ouvintes ou leitores da Diana FM se assustem com este ressuscitar do latim. (Se chegaram até aqui…) Uma língua de que os latinistas não aceitam, lá com as fortes razões que lhes assistem, a morte. E descambar assim a pena, que é como quem diz a tecla, para o latim não deixa de ser uma homenagem a estes estudiosos de uma língua tão imperial. A palavra escolhida, e o conceito que se lhe aplica, foi auctoritas.
Este termo não é traduzível e a portuguesa "autoridade" é apenas uma parte do significado da palavra latina. Da auctoritas também se trata, por exemplo, na literatura para se falar de textos muito antigos em que procurar-lhes a autoria não é questão de encontrar o indivíduo que teria feito o texto, mas os modelos que imitava, digamos assim, e que assumiam desta forma, enquanto auctoritas, a paternidade textual, sendo por isso aceites como seguindo uma regra validada.
A palavra auctoritas deriva, aliás, de auctor, que não o que é construtor mas antes o que inspirou a obra. Na base está um verbo que significa aumentar, desenvolver, fazer crescer, tornar mais forte alguém ou alguma coisa, pelo que a auctoritas, no seu sentido etimológico, tem a ver com exemplaridade, modelo, prestígio ou conselho. Auctor é assim o que promove com o seu exemplo e conselho o bem de uma coisa. Tão diferente da sua banalização traduzida em autoridade e que se mistura obviamente com poder. E que, além do mais, é treslida quer por tantos que a exercem abusivamente, quer por outros tantos que a julgam preconceituosamente quando bem exercida!
E é, por isso, que uma semana passada sobre o aniversário de Hannah Arendt, uma filósofa política que muito fez avançar sobre os conceitos de totalitarismo, relembro hoje definições de autoridade que aparecem em qualquer enciclopédia e que recolocam o termo no seu lugar, para que a ação corresponda à palavra: a autoridade é uma capacidade de influenciar os outros graças a uma certa superioridade por estes reconhecida;  é o direito de dar uma ordem, de tal maneira que o comando seja obedecido sem que seja questionado tal direito; é o poder que é aceite, respeitado, reconhecido e legitimado.

No direito romano, e para regressar ao latim, é definida por auctoritas uma certa legitimação socialmente reconhecida, que procede de um saber e que se outorga a alguns cidadãos. Exerce a auctoritas uma personalidade, ou instituição, que tem capacidade moral para emitir uma opinião qualificada sobre uma decisão. E se bem que tal decisão não seja vinculativa legalmente, nem possa ser imposta, tem um valor de índole moral muito forte. Parece mais difícil do que apenas dizer «quem manda aqui sou eu!».

14.10.14

Task-forces

Task-force é uma palavra que teve origem na Marinha dos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial e era o que se chamava a uma unidade militar temporária, criada especificamente para fazer uma missão especial e urgente. O termo também está muito ligado à procura por vários tipos de organizações de metas ou objetivos para um fim específico, onde é necessário que todos os envolvidos se unam e façam um esforço máximo para alcançar o que desejam ou o que precisam.
Atrever-me-ia a dizer que qualquer tarefa de equipa a que as pessoas se proponham ou sejam obrigadas a fazer, seja ela por força da lei ou por reação a uma situação que se considere caótica, deverá à partida ser presidida por este espírito da task-force. Cada “soldado”, na sua especialidade e disciplina, arregaçar as mangas, meter as mãos na massa que cada um conhece e trabalhá-la em conjunto até ao produto final. É este um espírito completamente oposto ao outro espírito que corresponde à manutenção de uma situação que apenas necessita de um acompanhamento, de uma correção aqui e ali, de um ajustamento por força de circunstâncias que se alterem e não por defeito do andamento que se tem dado ao que está em causa.
Quando alguém decide criar uma task-force é porque, de facto, reconhece que pode modificar o que encontrou. Para melhor, espera-se. Ou esperam aqueles que deram crédito a essa task-force pondo nessas mãos uma vontade sua. É assim que devem pensar aqueles que escolhem uma equipa para liderar, seja uma instituição, uma associação, um partido, uma autarquia ou um governo. Dar a ideia que se cria uma task-force, dando mesmo de barato que esta tenha o nome de gabinete ou comissão, e depois não fazer rigorosamente nenhuma mudança, para melhor volto a repetir, e que seja alguma coisa a que se possa chamar uma mudança, é uma fraude.

O que acontece amiúde é que há certas task-forces que aparecem assim, com esta aura a que só apetece incentivar com um «Go, go, go!» e que, depois, de mudarem tudo, fica tudo na mesma. Aí se revela das duas, uma: ou uma vontade expressa que assim seja, e a consequente indução em erro dos que acreditaram nessa mudança, ou a avaliação errada que fizeram da situação que queriam mudar, o que é uma pena, mas enfim, vale pelo menos pelo esforço.

7.10.14

O suspense, esse inquietante catalisador de interesse

O suspense é um artifício engraçado. Normalmente associamo-lo ao cinema, mas de uma maneira geral acontece com a ficção e depende de um enredo, pelo que também o há nos livros. É uma palavra de origem inglesa que, curiosamente, ouvimos muitos mais portugueses a pronunciar “à francesa”, o que me acontece a mim também. É uma situação que, no momento em que está prestes a desaparecer, acompanhamos com uma espécie de banda sonora - “tcham, tcham, tcham, tcham!” – que nos filmes tem também uma música muito própria e que, se desligarmos o som, lhe aligeira bastante o impacto.
É vulgar que o suspense sirva para fazer demorar um desfecho imprevisível. E é por isso que muitas vezes ouvimos dizer, fora das páginas ou dos ecrãs, que se fez suspense sobre um determinado assunto com o significado de criar uma expetativa interessada. O suspense é assim uma espécie de técnica propagandística em que a omissão de detalhes e o atraso do desfecho vão inchando de importância o facto sobre o qual se faz, ou mais frequentemente, sobre quem o cria. E o que é engraçado é que nem sempre é o próprio a dar a cara pelo suspense criado sobre si, havendo por vezes uma espécie de “guarda avançada” que se encarrega de o fazer. Tudo boas encenações, claro! Fico até convencida que há por aí muitos comentadores que têm esse posto fixo na tal guarda avançada… Ah! e há também aquela outra prática que não sendo suspense é da mesma família deste tipo de comportamento, e que é o “fazer caixinha”.
Por outro lado, o suspense que circula por aí dá azo ao “diz que disse”, diferente do boato que é uma mentira e não uma dúvida que circula, mas que fazem uma dupla que serve bem a desinformação e, como tal, alguns interesses. Também me parece que as diferentes reações de quem é visado e se mantém com as atenções voltadas para si por suspenses e boatos dizem bem sobre si próprios. Boatos ou não-ditos catalisadores de interesses sobre assuntos que são meramente pessoais, do domínio da privacidade de quem exerce cargos ou tem visibilidade pública, pouco merecem como resposta, em meu entender, senão o silêncio. Já quando as incertezas se criam e circulam sobre aspetos do exercício dessas funções públicas, e se se mantêm em circulação sem explicações pelos visados, então é porque o assunto não é claro, nem se pretende criar no espaço público uma relação de confiança na transparência das atitudes e das posições assumidas.
Enfim, tudo situações que acontecem um pouco por todo o lado e em todo o Mundo, nacional ou localmente, e que contribuem para uma desconfiança generalizada e, algumas vezes, injusta, nos políticos e nos que dirigem, por delegação do voto democrático, os destinos de governação. Era preciso que este hábito ou tendência se fosse erradicando em novas gerações… isto penso eu, em voz alta.