E neste Outono a febre da silly season
não desceu e surge agora uma nova actividade para quem participa empenhadamente
nas redes sociais. É o chamado “desafio do manequim”, em tradução do original Mannequin Challenge. Consiste, este
desafio, em fazer um vídeo onde um grupo de pessoas fica parado, em poses mais
ou menos complexas, precisamente como manequins. A criatividade de muitos
internautas levou a que o fenómeno ficasse famoso, replicado por famosos que
alguns conhecem e, na busca ansiosa da originalidade no repetitivo que estes
fenómenos têm, a dificuldade das posições encenadas foi aumentando. O efeito
pode ser hilariante e quem o faz estará seguramente a divertir-se muito.
O que poucos saberão, mas eu informo de acordo com o
pouco que investiguei por aí, é que o fenómeno deste mesmo Outono de 2016 já
tem uma história e regras que, obviamente, dificilmente nestas (e noutras)
coisas da vida se cumprem a rigor, e o vírus recria-se em mutações. E que
também já tem versões paralelas em que, tal como nos mitos, pode passar-se do
facto pessoal à verdade ritual. Pois fiquei então a saber, e partilho convosco,
que a música de fundo destes vídeos deveria ser sempre a mesma, a de um duo
chamado Rae Sremmurd, e se intitula “Black Beatles”, tendo até no videoclip que
a divulga, ao minuto 1:02’, uma recriação da famosa travessia de passadeira dos
Beatles, os originais, em Abbey Road. Parece que pode ter começado por um
desafio a senhoras famosas, com o impulso da Lady Gaga em biquíni, mas que,
entretanto, ultrapassou a obrigatoriedade da indumentária reduzida. Quem se
interessa por cinema não pode evitar comparações com algumas cenas de Matrix entre outros filmes que utilizam esta figura de
estilo, chamemos-lhe assim, para ajudar a contar uma história. Com tudo isto poderíamos
pensar que a coisa já teria uns mesitos. Qual quê?! Começou em Outubro e, como
qualquer epidemia, espalhou-se viralmente pela Internet chegando a muitos dos
50% da população mundial que lhe têm acesso. Pois, só 50% e nós que a usamos a
acharmos já que somos o mundo todo…
O manequim, que é aquela espécie de boneco que representa
uma figura humana, e que serve para estudos na área das artes plásticas ou para
assentar trabalhos de costura, também pode ser o nome dado à pessoa que exibe
modelos de costureiros, e tem dois sentidos figurados que, não sendo sinónimos,
têm entre eles um ou outro lacinho de afinidade. Se se pode dizer de um vaidoso
janota que é um manequim, também se aplica o termo a alguém que não tem vontade
própria e pode ser, como uma marioneta, manipulado.
Ora este fenómeno em que todos se transformam em
manequins para aparecer, numa pequena e inócua vaidade, nas redes de (quase)
toda a gente, faz-me é pensar naqueles que, mudos e quedos que nem manequins, e
pelo contrário já não tão inócuos, nem sendo na brincadeira, parecem esperar a
melhor oportunidade para saltar para a ribalta e atravessar-se no caminho de
alguém, e que, outro alguém manipula com vontade e interesses próprios, lhe
aponta as luzes, faça ouvir-se a música e o que vier soará sempre a uma
grandessíssima encenação disfarçada de improviso, acaso ou até causa-efeito
natural. Esse improviso saudável que arranca o riso ou até só o sorriso e que o
Mannequin Challenge tem, na rapidez com
que se espalhou, e que provavelmente e à semelhança de outros poderá vir a
servir alguma causa, essa sim, socialmente relevante, como o do menos artístico
desafio do “banho gelado”. Parecem, estas brincadeiras, tão mais para levar a
sério que as outras que se fazem para dar um ar sério…