22.5.18

Claques, cliques e casuals


A violência é o que é e não há argumento que a desculpe. Podem compreender-se motivos, não servem é estes como justificação para a legitimidade da agressão, nem retiram aos agressores nem que seja a vergonha pessoal, ou pelo menos social, do acto violento. Apesar das comemorações dos 50 anos do Maio de 68, onde a violência de intelectuais ou candidatos a tal não deixou de ocorrer, apesar do anacrónico momento fairytale vindo das ilhas britânicas, aquilo de que todos falam ou ouvem falar e que se passou para cá do Tejo, em Alcochete, não podia passar-me ao lado e, como tal, cá vão algumas parcas (em palavras) reflexões sobre o assunto.

O direito de as pessoas se associarem ou não está consagrado na nossa Constituição democrática. Chegar a um extremo de denunciar esse direito na área dos que se juntam em torno de outras associações onde o centro das actividades é o desporto parece-me um sinal grave do populismo mais barato: soluções fáceis para problemas difíceis e de abertura de precedentes descontrolados. E como está bom de ver, claques existem em muitos mais sectores do que o do desporto. O que acontece é que no desporto, sobretudo o futebol no contexto português (mas não só), a visibilidade e o negócio em torno do ócio tem um peso imediato e visível enorme, relativamente a outras actividades até muitas vezes mais decisivas no que diz respeito à vida dos cidadãos (dos que gostam ou não de futebol). 

As claques são a face folclórica, no pior sentido do adjectivo, das cliques. As que agitam pompons e tiram selfies. As que erguem punhos e envergam objectos e roupagens com símbolos identificadores do motivo por que se comportam algo mais histrionicamente e de modo desajustado noutros contextos, mas num comportamento social civilizado e, logo, observando regras de civismo consensualizadas. E mesmo quando a claque sobe de tom, dentro do ambiente onde é tido como aceitável, nunca a violência poderá ser o limite aceitável.

Já as cliques se definem como grupos de indivíduos que se relacionam entre si porque têm interesses comuns. O relevantes nas cliques é que, por definição, elas permitem que os seus membros circulem entre outras cliques de interesses diferentes daquela clique em que, num determinado momento, actuam como pares exercendo as pressões, pelos menos sociais, pelas quais são reconhecidas. E ele há cada cruzamento de membros de cliques! Até custa a acreditar... Por vezes há até membros de cliques que dão muito jeito por darem origem a boas claques onde, de resto, igual número de vezes é o único contributo que trazem ao interesse até público da clique em que se integram.

E depois há os casuals. Estes são os que actuam em nome de cliques e claques, que por estarem descaracterizados comprometem precisamente quer as claques, quer as cliques. Juntam-se casualmente para passarem a ter comportamentos que envergonham tudo o que seja identificado com o conceito de organização, embora até também, normalmente, se apresentem bastante organizados e coordenados. Vá-se lá saber é por quem! Este suado esforço organizativo, origina, para além de sangue e lágrimas, muita tinta, muito soundbyte, muito “achismo”. Acabar com claques pode levar ao fim do direito de reunião e manifestação, proibição de má memória. E isso é coisa para mim impensável, mesmo tendo já sido alvo de uma certa violência, não física apesar de tudo, resultado de uma certa sanha grupal, umas vezes de cliques outras até de claques.