2.2.16

Papagaios Sem Penas 2

Com Presidente novo a preparar a posse depois de uns longos cinco anos, quatro dos quais com um Governo, uma maioria e um Presidente da mesma cor, todos sob a capa rota de um alegado rigor, o que só agora vai sendo tornado público apesar de já todos sentirmos há muito o ar a passar por entre os furos, aqui vem uma crónica que, como tinha anunciado, se socorre novamente do conselho de Vergílio Ferreira «Afirma com energia o disparate que quiseres, e acabarás por encontrar quem acredite em ti.».
Com o resultado de eleições presidenciais, de facto podemos aceitar que todas as críticas ou todos os louvores se façam a uma determinada pessoa, como demos conta com todo o zurzir até à náusea no Presidente Cavaco, que estava já quase moribundo nas suas funções. A fulanização é, pois, inevitável. O que me parece que para o que já não há pachorra é para continuarmos a ouvir os mesmos argumentos de teatro vaudeville de há décadas, por parte da grande oposição ao actual Governo, suportado por três partidos ainda assim diferentes em muitos princípios ideológicos e, sobretudo, na interpretação e aplicação que fazem desses princípios que teorizam sobre o exercício da governação.
Torna-se curioso e interessante assistir, no actual contexto, à argumentação de uma esquerda que, por muito que se divida, quer-me parecer que se se continuar a radicalizar, arrisca a nunca mais sair como candidata credível para governar. Nem como parceira de uma equipa em que os princípios que os unem se fragilizem por reforço de outros, que os separem, tantas vezes bem pouco relacionados com o bem-comum e muito mais com determinada clientela (uma coisa comum à esquerda e à direita, aos de cima e aos de baixo). Mas dizia: se é interessante ouvir a argumentação das esquerdas, tem sido confrangedor assistir às intervenções em vários lugares e através de diversos meios de ex-ministros. E é claro que se nota ainda muito mais no discurso de quem é oposição.
O clubismo continua a vigorar não apenas no Parlamento, mas nos comentadores seguidistas disseminados um pouco por toda a comunicação social, formal ou informal. O spinning e os soundbites continuam a seguir uma prática que, ficou provado nas legislativas, devem ter mais efeitos endémicos nos Partidos do que pesam na decisão dos eleitores. É que nem o discurso a espremer a situação dos pobres, nem o de acusar-nos a todos de esbanjadores que é preciso reeducar como se de corrécios nos tratássemos, parecem ter tido, em Outubro passado, muitos efeitos sobre o eleitorado vulgarmente até aqui encarado como uma horda que vai toda atrás do mesmo. Esses que eram assim, quer-me parecer que são os que já nem votam, passando de crédulos a completamente descrentes…
Acautelem-se, pois, os que usam as palavras como ferramenta ou instrumento das suas funções, porque elas têm de começar a recompor-se em discursos em que a realidade não se adapta, nem à força, ao discurso quando este se parece muito com os lugares do lazer, do entretenimento, da ficção ou do inábil lugar-comum. Eu acrescentaria ao divertido conselho de Vergílio Ferreira que, actualmente, será preciso procurar muito mais para encontrar um crente no disparate. É que eu ainda tenho esperança que a tendência do percurso desta nossa Humanidade, e portanto a reflectir-se no comportamento das novas gerações ou dos que as têm sabido acompanhar (porque os há e aqui ao pé de nós), se nos faz mais distraídos com outros assuntos para lá da governação, faz-nos menos dados a confiar, quando somos chamados a intervir, no que pareça ser próprio de outra esfera diferente da desta séria matéria.
Mas vamos continuando a acompanhar o que faz quem nos governa e quem se lhe opõe, agora que as campanhas terminaram, as câmaras da televisão e os microfones regressaram das arruadas. Façamo-lo com espírito crítico, imaginando-nos nos sapatos de quem tem responsabilidades, sejam elas na governação ou na oposição, sem deixarmos de olhar o mundo e o futuro com os nossos próprios olhos, ou melhor com as nossas celulazinhas cinzentas que, como dizem alguns, “Deus nos deu”.