Com Presidente
novo a preparar a posse depois de uns longos cinco anos, quatro dos quais com
um Governo, uma maioria e um Presidente da mesma cor, todos sob a capa rota de
um alegado rigor, o que só agora vai sendo tornado público apesar de já todos
sentirmos há muito o ar a passar por entre os furos, aqui vem uma crónica que,
como tinha anunciado, se socorre novamente do conselho de Vergílio Ferreira «Afirma
com energia o disparate que quiseres, e acabarás por encontrar quem acredite em
ti.».
Com o
resultado de eleições presidenciais, de facto podemos aceitar que todas as
críticas ou todos os louvores se façam a uma determinada pessoa, como demos
conta com todo o zurzir até à náusea no Presidente Cavaco, que estava já quase
moribundo nas suas funções. A fulanização é, pois, inevitável. O que me parece
que para o que já não há pachorra é para continuarmos a ouvir os mesmos
argumentos de teatro vaudeville de há
décadas, por parte da grande oposição ao actual Governo, suportado por três
partidos ainda assim diferentes em muitos princípios ideológicos e, sobretudo,
na interpretação e aplicação que fazem desses princípios que teorizam sobre o
exercício da governação.
Torna-se
curioso e interessante assistir, no actual contexto, à argumentação de uma
esquerda que, por muito que se divida, quer-me parecer que se se continuar a
radicalizar, arrisca a nunca mais sair como candidata credível para governar. Nem
como parceira de uma equipa em que os princípios que os unem se fragilizem por
reforço de outros, que os separem, tantas vezes bem pouco relacionados com o
bem-comum e muito mais com determinada clientela (uma coisa comum à esquerda e
à direita, aos de cima e aos de baixo). Mas dizia: se é interessante ouvir a
argumentação das esquerdas, tem sido confrangedor assistir às intervenções em
vários lugares e através de diversos meios de ex-ministros. E é claro que se
nota ainda muito mais no discurso de quem é oposição.
O clubismo
continua a vigorar não apenas no Parlamento, mas nos comentadores seguidistas
disseminados um pouco por toda a comunicação social, formal ou informal. O spinning e os soundbites continuam a seguir uma prática que, ficou provado nas
legislativas, devem ter mais efeitos endémicos nos Partidos do que pesam na
decisão dos eleitores. É que nem o discurso a espremer a situação dos pobres,
nem o de acusar-nos a todos de esbanjadores que é preciso reeducar como se de
corrécios nos tratássemos, parecem ter tido, em Outubro passado, muitos efeitos
sobre o eleitorado vulgarmente até aqui encarado como uma horda que vai toda
atrás do mesmo. Esses que eram assim, quer-me parecer que são os que já nem
votam, passando de crédulos a completamente descrentes…
Acautelem-se,
pois, os que usam as palavras como ferramenta ou instrumento das suas funções,
porque elas têm de começar a recompor-se em discursos em que a realidade não se
adapta, nem à força, ao discurso quando este se parece muito com os lugares do
lazer, do entretenimento, da ficção ou do inábil lugar-comum. Eu acrescentaria
ao divertido conselho de Vergílio Ferreira que, actualmente, será preciso
procurar muito mais para encontrar um crente no disparate. É que eu ainda tenho
esperança que a tendência do percurso desta nossa Humanidade, e portanto a
reflectir-se no comportamento das novas gerações ou dos que as têm sabido
acompanhar (porque os há e aqui ao pé de nós), se nos faz mais distraídos com
outros assuntos para lá da governação, faz-nos menos dados a confiar, quando
somos chamados a intervir, no que pareça ser próprio de outra esfera diferente
da desta séria matéria.
Mas vamos continuando
a acompanhar o que faz quem nos governa e quem se lhe opõe, agora que as
campanhas terminaram, as câmaras da televisão e os microfones regressaram das arruadas.
Façamo-lo com espírito crítico, imaginando-nos nos sapatos de quem tem
responsabilidades, sejam elas na governação ou na oposição, sem deixarmos de
olhar o mundo e o futuro com os nossos próprios olhos, ou melhor com as nossas
celulazinhas cinzentas que, como dizem alguns, “Deus nos deu”.