Eis-nos de volta às crónicas, num
momento em que as rentrées estão
todas feitas. Na realidade são só duas: a dos partidos políticos e a verdadeira
que é a escolar, bem mais abrangente e influente na vida do dia-a-dia dos
cidadãos, mesmo os que não são diretamente nela envolvidos. Um lugar muda
quando mudam os ritmos das pessoas que nele vivem.
Fiquei contente com o renovar do
convite da Diana. Acho que é uma honra esta oportunidade que me tem dado de
ocupar um espaço público de opinião, numa rádio que tem na pluralidade um
princípio basilar à vista, ou melhor ao ouvido, de quem a sintonize. Numa época
em que, felizmente, toda a gente pode dizer o que pensa, em circuitos mais ou
menos fechados, e muito também graças a esses outros espaços de comunicação sem
intermediários que são as redes sociais, nunca uma opinião pôde ser tão lida ou
ouvida como nos tempos que correm.
Também é verdade que muito do que
fica dito e escrito nestas crónicas de opinião não ficará para a história dos
aforismos e citações, como aquelas que também vemos circular por aí, por vezes
até com duvidosa certificação da origem. Também por isso as crónicas se adaptam
ao tempo médio da capacidade humana em prestar atenção ao que é dito, e o ritmo
dos dias é, mesmo no interior do país, condicionante dessa capacidade.
Se já fiz uma série de crónicas com
provérbios como mote, e outra com verbos como inspiração, esta nova série vai
ter precisamente as citações de gente que sobrevive nelas a dar o tom. É uma
espécie de “como diz o outro” a propósito de um tema com que nos cruzamos ao
longo das semanas. Mas é também uma maneira de poder opinar sobre pensamentos
que, assim descontextualizados do seu momento e contexto primordiais, podem
ganhar novos sentidos. Shakespeare terá afirmado mesmo que «o êxito de um bom dito depende mais do
ouvido que o escuta do que da boca que o diz.»
Fazer reviver assim as palavras que já foram ditas é, no fundo,
devolver ao seu autor a responsabilidade da sua autoria. Tudo isto com o devido
desconto de, ao valorizarmos as palavras de quem conquistou através delas uma
espécie de eternidade, cobrar o troco de não se apagar o diálogo que a
mortalidade interrompe.
As minhas crónicas serão, pois, sobre citações de gente que, não
estando no mundo dos vivos, se mantém por cá. Mas não será de admirar que, uma
outra vez, cite gente que anda aí no ativo e que pensa que, pelas palavras lhes
serem leves, haverá quem não as escute e, mais uma vez, eu lhes cobre pelo
valor que têm ou acho que deviam ter.
(crónica de dia 1 de outubro)