8.2.12

Para o preguiçoso todos os dias são feriados

Vou hoje falar sobre esta coisa das propostas de alteração aos feriados e consequente questão das pontes. São assuntos que me incomodam um bocado. Sobretudo porque há nelas uma desculpa tão esfarrapada que, às vezes, dou comigo a pensar que eu é que não devo estar a ver bem as coisas.

Comecemos então pelas pontes. Por que raio é que as pontes têm de ser eliminadas servindo de desculpa para o fim de feriados? Ponte que é ponte só é autorizada se puder ser feita. A figura da ponte não existe naturalmente. É construída por quem quer “meter” um dia de férias, aproveitando um fim-de-semana e fazê-lo maior. Ora as férias, ao que eu sei têm de ser superiormente autorizadas, ou qualquer empresa ou repartição correria o risco de não abrir caso todos os seus trabalhadores tirassem férias ao mesmo tempo. Eu acho que as pontes, e o problema que estas podem levantar, tem única e exclusivamente a ver com o exercício ou não de um cargo de chefia. Ou bem que se chefia e se organizam as coisas para que o que se chefia funcione; ou bem se chefia porque já se trabalha naquele sítio há muito tempo, ou se fez muita formação, ou uma outra razão que não me apetece aqui mencionar. Chefe que é chefe também tem de dar uma má notícia de sua iniciativa e não apenas porque alguém mais acima manda mais. E chefe que é chefe, quando dá essa má notícia é compreendido por aquele a quem a dá. Porque chefe é chefe não é mensageiro. Eu cá gosto muito de feriados à quinta ou à terça, sem precisar de “meter” o dia do meio e fingir que estou de férias. É que sabe mesmo a bónus e leva-me a louvar quem mereceu que o que fez fosse comemorado para todo o sempre! Mas isso sou eu.

O que, no entanto, me está a aborrecer mesmo muito é a morte daqueles feriados. Primeiro porque não percebi as contas do toma lá dois e dá cá dois. Até porque os Fiéis são-no mesmo, com ou sem feriado. 13 de Maio não é feriado e Fátima está sempre cheiinha a abarrotar. E depois parece-me a mim que há mais feriados religiosos ou assim-assim dos que o que se ligam diretamente à História da Pátria.

Também deve ser por ser neta de republicano convicto, que foi presidente da associação académica de Coimbra, fundador do MUD – Movimento de Unidade Democrática, Deputado da Constituinte, tendo por isso participado ativamente na redação da atual Constituição Portuguesa, e presidente de uma Assembleia Municipal até morrer, maçónico ou não, não sei, porque nunca lhe ouvi nada sobre o assunto, deve ser por causa deste “caldo” em que cresci que o eminente fim do 5 de Outubro me custa horrores. Aliás, o pouco que o cidadão comum de hoje em dia sabe sobre a Revolução Liberal de 24 de Agosto de 1820, que levou dois anos mais tarde, à primeira Constituição Portuguesa, bem como à independência do Brasil em 1822, passará muito, também, pela não celebração da data em feriado. Não estou a dizer que se deva acrescentar este feriado ao calendário, quero apenas demonstrar que a não comemoração destas efemérides é um contributo valente para o seu esquecimento. Talvez por isto mesmo também, este ano em que se anuncia a morte lenta do 5 de Outubro, o 31 de Janeiro foi lembrado por republicanos convictos, já que foi neste dia, em 1891, que ocorreu a primeira tentativa de implantação do regime republicano.

Podem dizer-me que as comemorações vão continuar, e vão. Mas continuarão entre aqueles que pela educação, formal, informal ou não-formal, terão sempre essa tarefa como prioritária, mesmo entre a preocupação da prestação da casa e do carro. Uma minoria, portanto. As famílias viáveis, às tantas. As restantes, que naquele dia, por ser feriado com celebração oficial, ao ligarem a TV ou o rádio não vão ouvir a razão de ser da eventual folga (até porque muitos trabalham em dias feriados).  

Celebrar uma efeméride é não só homenagear o passado, relembrando aqueles que nos trouxeram até hoje naquilo que somos, como ter sempre a oportunidade para garantir que no futuro não sejam esquecidos, nem figuras ilustres, nem práticas antigas, nem marcos patrimoniais, que encerram em si as memórias desse passado. Celebrar uma efeméride com um feriado não é, pois, um apelo à preguiça, pois como todos sabemos e o povo muito bem diz, «para o preguiçoso todos os dias são feriados».