14.11.23

Marcelismo vs Democracia

Parece-me que Marcelo Rebelo de Sousa ficará para a história como o PR que, em Democracia, pior fez à Democracia.

Curiosamente, foi em parte a posição de Marcello Caetano, padrinho deste Marcelo 2.0, a propósito da guerra, a colonial, que, mesmo com as promessas primaveris, deu origem a tempos tão ou mais obscuros que os do salazarismo. A conversa que o Marcelo de agora fez sobre o conflito israelo-palestiniano, com subsequente presença numa manifestação; tal como o caso da cunha para as gémeas, a ser revelada quando, precisamente nesta guerra comentada com aquela ligeireza, são as crianças que em maior número são suas vítimas; estas duas situações guiaram-no num caminho de cegueira para o qual arrastou a Justiça. E os estragos também terão a sua assinatura. O que aconteceu na semana passada foi mais um espectáculo para os meios de comunicação às massas, como tudo em que este PR está envolvido; um jogo “Marcelismo vs Democracia” da primeira mão de um importante campeonato: o do Centenário do Regime.

Explico a comparação: Marcelo agiu como o governante que mexe os seus cordelinhos sem pudor de, ao fazer bem a uns (as gémeas serão provavelmente um caso entre muitos), prejudicar o todo. Se sabemos que as “cunhas” são um pão nosso de cada dia mordiscado em todas as esferas, todas, também acabaremos por concluir, mais cedo ou mais tarde, que as influências, os conselhos e as negociações têm de ter base sólida de argumentação que aguente e sirva para melhorar práticas e resolver problemas sem criar outros, e até mais graves. Que se aconselhe alguém para um cargo para o qual seja efectivamente útil e competente; ou que se sugira um procedimento para outro alguém que melhore os procedimentos para todos os que vêm a seguir, melhorando um sistema que esteja montado e apresente falhas de eficiência, é exercer uma magistratura de influência; o resto são simulacros próprios da incompetência em lugares de poder.

E também não deixa de ser tristemente curioso que a crise política mais grave do regime tenha sido espoletada por palavras. Palavras proferidas, por escrito, por autor-sombra - o gabinete de comunicação da Procuradora - com o pior estilo de “innuendo” de mau jornalismo, revelando a mediocridade de quem deveria ter o sentido de Estado equivalente ao peso institucional do lugar que ocupa. Pôs-se a responsabilidade nas mãos de quem, com comportamentos de “influencers”, põe em causa um trabalho em curso de um projecto para o País que era bastante defensável, embora sempre democraticamente criticável.

Continuaremos, na segunda parte do Centenário, a percorrer o caminho que repare as brechas no Regime e o reforce? Ou voltaremos atrás, a achar muita piada, muita gracinha, a um Portugal dos Pequenitos dos tempos do padrinho de Marcelo? A estas perguntas, para além de tentarmos defender o que pensamos ou queremos, pouco mais poderemos responder do que lançando búzios.