Não queria estar na pele de um juiz, embora a função de
ajuizar faça também parte da minha profissão. O mais frequente é ajuizar-se em
função de regras estabelecidas, dar-se exemplos de respostas acertadas ou
cumprirem-se critérios o melhor definidos possível, para que não se mudem, à
traição, as regras a meio do jogo. E a opinião, a ser critério, tem de ter
argumento sólido. Ainda assim, é difícil: o mínimo deslize pode dar cabo de uma
vida.
Parece que, ao contrário do que acontece noutros países, o
sistema judicial em Portugal é pouco escrutinado. Tudo parece resolvido não
apenas no sigilo que a delicadeza do juízo do crime e castigo exigem, mas num
recato contextual que favorece a opacidade. Os casos dos juízes que vieram a
público começaram a levantar uma pontinha desse véu e, já agora, podiam
fazer-nos estar mais atentos daqui para a frente. É que não há corporações
imaculadas e muito menos ungidas contra as fraquezas humanas. Se não forem os
princípios que sustentam as instituições, onde está afinal o verbo em forma de
“palavra de honra”, a definir os comportamentos ajuizados dos que os queiram
integrar, se não forem os princípios a enformar o critério, nada poderá
funcionar com credibilidade. E como sabemos tudo isto tem de ser constantemente
monitorizado, no que se chama também escrutínio.
Já tivemos o caso Tancos a expor escandalosamente o
funcionamento claudicante da instituição militar; agora este escândalo na
instituição que aplica a justiça aos cidadãos. Estamos, de facto, na altura de
exigir respostas e sobretudo mudanças, porque nada pode continuar na mesma. Sob
pena de falsos profetas ganharem adeptos em quem usa apenas os dois dedos de
testa que tem para achar que problemas complexos têm respostas simples,
normalmente rematadas com pontos de exclamação. E isso seria o pior que nos
podia acontecer.
Temos
mesmo de aproveitar o facto de o microfone estar apontado para esse tipo de
discurso - o populista que chega de todas as direcções - e combatê-lo com a
retórica certa. E essa é a que reside indubitavelmente no acto que a palavra
designa. Sem os rodriguinhos que as estreitezas - partidárias e corporativas -
ainda promovem.