Tivemos de novo as forças desiguais da Natureza que desasam os humanos. Todos os humanos. Da costa Oeste da América do Norte à costa mais Oeste da Europa. Não me venham por isso falar de conspirações... De novo os mais vulneráveis, os que com ela, a Natureza, convivem, até que se revolte, em cumplicidades invejadas ou incompreensíveis para os que vivem dela mais afastados, são as suas primeiras vítimas. Como se os santos da casa não fizessem milagres, ou só fizessem a alguns: àqueles que ouvimos, incrédulos. Eles incrédulos pelo milagre de terem escapado, incrédulos nós por não nos conseguirmos imaginar na sua pele. Os medos na Cidade, uns mesmo à espreita outros atávicos, levam-nos a sentir na vida no campo, junto dela, a Natureza, uma espécie de nostalgia do paraíso terrestre. E quando o paraíso se transforma em inferno, ficamos à procura da mesma lógica que explica os “porquês”. A lógica que se aplica a nós, os da Cidade, grande ou pequena, onde os quatro elementos – fogo, ar, terra, água – estão relativamente domesticados, onde a dureza da pedra e da cal ou do tijolo e do cimento não atrai o fogo como a seiva dela, a Natureza.
Transformamo-nos todos, os que assistimos ao que parece, e desejávamos que fosse, só uma história de terror, naquela personagem que investiga o crime. E nessa ânsia humana de remediar com a justiça o que tantas vezes é já só uma pálida amostra de um remédio que cura a dor, esquecemos que na procura do culpado um longo percurso requer que à pergunta “quem?” venha antes a pergunta “porquê?”. Na recolha das provas, o móbil do crime é a meada de fios da qual talvez apenas só um seja o condutor que liga a vítima ao carrasco. É desse trabalho de investigação, pesquisa, minúcia, cuidado, que se pode chegar ao fim e descobrir o “quem”. Mas mais: é com esse trabalho que se evita que, quando as vítimas parecem ser em série, se tomem as devidas providências para que não chegue a haver a próxima vítima. Não garantimos que não se repita, mas tentamos. É desse trabalho que podemos, quando ela, a Natureza, mostra a sua fúria ter connosco o conhecimento, a técnica, o instrumento que torne esse medir de forças menos desigual. É trabalho, é empenho, é concentração de esforços de equipa e não de uns a quererem livrar-se dele e outros a querer despachá-lo para recolher dele os louros. A culpa? A culpa há-de ter que se apurar, claro. Até com o risco de podermos vir a não gostar de ter encontrado “aquele” culpado. É tempo de ter esse trabalho. Já era, há muito. Silêncio! E fale quem sabe que nós estamos cá para ouvir e aprender. Também a sobreviver.