Era
uma vez um jornalista de opinião de direita que gostava de ter sido governante
político. Como a vida o levou para outro lado – aquele lado em que, qual Egas
Moniz o Aio (procurem a lenda que também vale a pena, aprende-se sempre), os
filhinhos, agora mais em número do que em género, são colocados ao serviço dos
interesses dos progenitores –, o jornalista de opinião de direita optou por
levar a vida junto dos bem sucedidos humoristas daquele pequenino país, mas
grande e acertado com o resto do Mundo mundial e tudo. Era nessa mesma vez um
governante habilidoso que sabia bem que, só às vezes, era preciso praticar a
máxima “se não os podes vencer, junta-te a eles” e resolveu aceitar um pacto
ficcional que lhe propunha o tal jornalista. E foi assim que aconteceu...
Certo
dia, o governante, a propósito da visita de uma figura importante do estrelato
mundial que move multidões, resolveu proporcionar aos seus fãs uma folga no
trabalho. Era a oportunidade de estarem com aquela figura, ou no recinto mesmo,
ou por transmissão directa nos vários órgãos de comunicação que, como todos
sabemos, constituem suporte básico de vida de jornalistas, governantes,
anti-governantes e gente que tenta ficar a saber mais do que se passa à sua
volta. Se a alegria foi muita, houve, como em todas as histórias, quem tivesse
achado que era uma chatice acontecer assim uma espécie de feriado convocado à
laia de greve, com pré-aviso tão curto. Ora, o jornalista era um desses
aborrecidos com a habilidade do governante e encontrou ali a sua oportunidade
para fazer um número à maneira dos humoristas (atenção que entre quem tem humor
e quem é humorista vai uma distância tão grande como quem dá umas voltas à
cidade para manter a forma e a saúde e quem tem mínimos para competir nos
campeonatos mundiais de atletismo!). E resolveu protestar contra o facto de
aquela medida o ter deixado, naquele dia, sem o lugar habitual onde os seus filhos
o passariam se não estivesse fechado para que os que ali trabalhavam exercessem
a tolerante oportunidade, concorde-se ou não com ela, de sacrificar
pontualmente o bem público por outro que até poderia vir a tornar-se-lhe mais
útil (como as greves, que reclamam melhor bem-estar económico-social dos
indivíduos, mas aqui ao serviço de uma identidade de contornos mais espirituais
e invisíveis). Ameaçou então deixar os seus filhos à porta daquele de quem
tanto parecia desconfiar, o dito governante da nossa história.
O
governante habilidoso, e porque o era, pensou antes de agir. Imaginou um
cenário de outras possíveis situações em que, por encerramento de instalações,
lhe pudessem vir ali deixar hordas de criancinhas ou outros produtos (sim
produtos, que é o que normalmente numa sociedade contemporânea se deixa à porta
sem garantia de que lá de dentro alguém os recolha). Mas de cada vez que foi
pensando essas possibilidades só imaginou, assim de repente, como cenários mais
prováveis: sindicatos, câmaras municipais, estações aero, rodo e ferroviárias,
centros de saúde ou hospitais. E depois, pensou ainda, se tanto mal diziam
dele, o mais natural era que os extremosos progenitores não arriscassem vir
deixar os seus amados filhos à guarda de quem normalmente diziam o que Maomé não
disse do toucinho. E se bem o pensou, melhor o fez. Aceitou a ameaça e os
meninos lá tiveram a oportunidade de passar um dia num dos epicentros dos
destinos daquele país pequenino. Do que se passou a seguir, muitas histórias e
finais mais ou menos felizes se ouvirão, uma vez que, como felizmente se sabe,
os colegas do jornalista de opinião de direita e os governantes são gente que
sabe como as palavras podem mudar as realidades.
Entretanto,
numa galáxia bem perto de nós, um empresário chegado de fora àquele país
pequenino punha à venda um produto,
contemporâneo e muito útil aos que assistiram ao vivo ao motivo mais ou menos
óbvio do episódio acima narrado, e falo do recinto em que aquele grande
acontecimento deu folga a muitos. Tratava-se de um inovador recipiente cheio do
ar legítimo do dito lugar, uma adaptação local da tradição do mundo global
religioso das recordações de lugares sagrados. E a isto tudo assistiam os, por
ora, muitos e felizes habitantes daquele país, ao som de banda sonora original
de balada de Eurovisão e dress code
próprio com traje acessível a todos, composto por peça de roupa vermelha (sim,
já não há cá encarnados e vermelhos, vermelho é mesmo o new-red).
Ora
digam lá se não parece mesmo que comprámos bilhete, ou o ganhámos nalgum
concurso sabe-se lá por que artes, e estamos dentro de uma sala de espectáculos
à maneira? Vitória, vitória, acabou-se a história.