Agora que estão apaziguados os ânimos daquelas figuras
mais ou menos públicas a quem deu para prometer uns tabefes virtuais ou fazer
queixinhas do chefe, online e urbi et orbi, parece-me que voltar ao
tema da comunicação social em modo democrático é uma matéria que se impõe a
quem se ocupa de dinâmicas sociais e educa, a vários níveis, para a cidadania.
O Facebook®, para além de um imenso negócio
proporcionado por milhões e que enriquece poucos, é uma aparentemente simpática
rede social que permite, na era das tecnologias ao serviço de (quase) todos,
manterem-se as pessoas em contacto e comunicarem. Passámos muito depressa de
uma sociedade em que se dizia que os valores individualistas também se deviam à
falta de comunicação entre as pessoas, para uma sociedade em que a toda a hora
podemos estar a comunicar os pormenores mais íntimos com todos, ou com aqueles
com quem escolhemos criar uma rede. Não tenho dúvidas que, por exemplo, muitos
de nós que a utilizamos já por lá reencontrámos amigos de infância, de juventude
ou de trabalho que a vida se encarregou de afastar, e que temos podido
acompanhá-los com som e imagem ou desabafos, nos momentos que queiramos
partilhar uns com os outros.
O que se passa, então, é que para nessas comunidades que
criamos acabarmos por ter as companhias que merecemos isso dá-nos o trabalho de
termos de filtrar, sem estratégias de censura de má memória, aqueles com quem
não nos apetece conviver, nem virtualmente. Isto não quer dizer que não haja
quem use precisamente esses métodos, em versão caseira da espionagem, e crie os
chamados perfis falsos para, simulando dar a cara, “sacar” informações sem o
fazer. E “sacar” informações já é quase só uma brincadeira de meninos, porque
há quem o faça para achincalhar, difamar, enfim perturbar e influenciar os
ainda crédulos ou, pronto, mais preguiçosinhos (e sim, penso nos jornalistas
que se dão a pouco trabalho de investigação e se limitam a ser megafones daquilo
que têm disponível numa rede social, apesar de poucochinho e obviamente longe
da imparcialidade da informação que uma boa notícia tem). E os mais crédulos, o
chamado público em geral, tendem tantas vezes a julgar que “onde há fumo há
fogo”, e muitos utilizam os sinais de fumo para levar a sua avante ou trazer a
água ao seu moinho. Uma prática muito pop, para usar uma simpática abreviatura
aplicada a comportamentos de grandes colectivos ou massas.
As atitudes, mais chocantes para uns do que para outros,
que se têm em perfis ditos públicos, ou seja abertos a todos, são por definição
alargados para fora do nosso círculo de amigos e todos os cuidados, quer
connosco quer com os outros, devem ser por isso muito levados em conta. E como
em tudo, há que conhecer e reconhecer as circunstâncias em que as grandes
declarações escancaradas ou os innuendos
mais matreiros são expostos nestas novas plataformas de comunicação por
indivíduos às massas. E os indivíduos que as produzem, sem os media a tratar do assunto para o bem e
para o mal, devem saber, e muitos até sabem, reconhecer-se como principal alvo
de avaliação dos outros, para além da vontade que têm que os que os leiam
avaliem aqueles de quem dizem coisas.
É também por isso que quando conhecemos as pessoas,
porque fazemos efectivamente parte da sua rede social ou porque já lhes
conseguimos tirar a pinta, muito do que vamos lendo não nos ofende, choca ou
espanta. A alguns até podemos elogiar como coerentes, com ou sem ironia. Nada,
no entanto, colide com o facto de que, quando se assumem diferentes cargos e
ser nesses cargos que somos avaliados por outros em público, ser também assim
que, em público, devemos perceber que representamos muito mais do que aquilo que
somos, tornando-nos um exemplo alargado, ou seja uma parte que qualifica um
todo. O nosso autor dá um conselho, não aos que sabem exactamente o que estão a
fazer e querem continuar, mas aos que pensam que se pode dizer tudo, ou talvez
nem pensem que aquilo que dizem é o que acaba por defini-los. Diz o Vergilio Ferreira:
«Uma forma de o medíocre convencido imitar a grandeza é não dizer mal de
ninguém.» O espaço público, digo eu, seria muito mais seguro e sério, mas
também muito menos divertido.