4.12.12

RESISTIR

Depois de dias de discussão, depois de aprovado o orçamento, o PM falou na TV e anunciou mais medo aos cidadãos. Os cidadãos já tinham começado a desconfiar que isto ia ficar pior, mas as palavras às vezes aliviam a dor antes dela aparecer com força e mascaram o mal que a causa. O medo começou a acentuar-se e aquilo que eu digo, em desabafo ao meu filho, é que vamos entrar numa guerra. Assustado, ele que se aproxima da idade de ir ao Dia da Defesa, manifesta o seu espanto. Não é guerra, guerra, de bombas, tanques, trincheiras e bombardeiros. Mas haverá um rasto de morte, mesmo que a morte seja o destino mais natural e certo que temos. Haverá um rasto de morte, mas os sobreviventes sairão mais fortes. Como nas guerras acontece aos que lhe sobreviveram. Mas aos mesmo vivos, não aqueles que respiram com a morte dentro deles.

Esta esperança da sobrevivência não é verde como a esperança normal. Não podia ser, porque senão seria o mesmo contentamento a que eu assisti expresso por um militante histórico comunista perante um movimento reivindicativo de uma classe – a dos empresários dos restaurantes. Nunca pensei ouvir isso da voz de um ser humano que lidera, ou liderou, opiniões com palavras como liberdade, justiça e outras que sabem a bom e a bem. Como a alegria. Estar contente porque há quem se reúna em torno de uma causa que é sinónimo de sofrimento? Ficou, de novo e mais uma vez, tudo explicado para mim. Tudo é aquela coisa do “quanto pior, melhor”.

Mas volto à esperança de sobrevivência, a minha esperança de sobrevivência. Essa esperança passa por tentar arranjar força para resistir. Para resistir à fome, ao desemprego, à mingua. Resistir à reação violenta que fará aumentar a fraude, o crime, a luta. Sim, porque a luta dói e magoa. Não estou também a falar no bíblico dar a outra face, nada disso. Resistir implica ter a força para mudar a forma de pensarmos, agirmos, relacionarmo-nos uns com os outros e reclamar os nossos direitos sem entrarmos na fraca posição de não cumprirmos os nossos deveres. Não podermos exigir quando não cumprimos parece um bom princípio de vida em comum. Mas, na circunstância de não conseguirmos cumprir e nos tornamos mais fracos para exigir, também não podemos cair no caos que só dá vantagem a quem, oportunisticamente, age de má-fé.

Resistir tem de ser fazermos opções, criar alternativas que nada têm a ver com a “imaginação”, como o senhor de Belém sugeria. Tem a ver com a união, com a cooperação, com o deixar de lado o espírito do constante competir que tantas vezes promove a exaustão. Resistir vai ter que ser cada um reorientar essas forças, que vão diminuindo é verdade, e juntá-las às de outros. É não perder nenhuma oportunidade para exigir direitos de cidadão e exercer deveres de cidadania. Resistir tem de começar, em cada um de nós, por mudar.