24.10.12

REZAR - 16 de Outubro

Nesta semana que passou fiz uma coisa que não fazia há muito. Fui à missa. Igreja católica na cidade de Évora. Um homem bom que conheci e com quem convivi alguns anos morreu, velhote, e fui à missa que assinalava o sétimo dia da sua morte. Não senti que lhe tivesse servido já de muito este meu gesto, mas cedi afinal à tentação de aliviar a minha consciência com esta espécie de homenagem. Se eu fosse sempre à missa a coisa diluir-se-ia na banalização da prática, mas aquela hora que usei ali serviu-me para pensar nele, na vida, dos outros e claro também na minha. Egoísmos…

Igreja cheia com novos e velhos, mulheres e homens. Apresentação powerpoint de orações, que eu ainda sabia de cor, com ligeiras alterações musicais e a roçar o modelo de entretenimento, o que só mostra atenção ao que se passa no resto do mundo. Parece que o dia também era excecional para o próprio calendário e agenda interna da Igreja Católica o que justificou o número de padres a celebrarem o ofício, as vestes de festa, a incursão do turíbulo por entre os fiéis e pelo menos uma assistente de ocasião… talvez houvesse outros como eu. Enfim, senti-me bem mas de visita num lugar a que não pertenço mas ao qual voltarei as vezes que forem precisas.

Nem de propósito, mas por coincidências em que acredito, tinha estado durante a tarde com um casal de idosos que viveu uma boa parte da sua juventude em Évora. Ela professora primária reformada, ele sei que pintor nas horas vagas. O senhor quer oferecer uma obra sua ao município e pediu-me que, antes de começar a pintá-la o visitasse para que conversássemos um pouco e me mostrasse os seus quadros. Perante isto, e aproveitando uma ida em trabalho à capital, não pude deixar de fazer um desvio, até como reconhecimento deste seu gesto para com a Cidade que será mais uma vez retratada. Era o mínimo. Foi um bocado de tarde bem passado que me confirmou o quanto podemos aprender com quem vive neste mundo há mais um pedaço de tempo do que nós. 

Entre um e outro assunto falou-me o artista de duas obras que acabara de pintar e que, na sua visão do mundo, representavam, em par, as duas atitudes que ele via restarem a quem vive este presente que rezará, certamente, para a história como um período negro. Uma idosa a rezar, um jovem de braços cruzados. Rezar e esperar. Afinal espécie de sinónimos, mesmo que em sentido figurado rezar possa ter o significado de resmungar.

A impotência que os cidadãos portugueses vão sentindo perante notícias que parecem desabar sobre eles a um ritmo com cadência demasiado frequente, a par de enérgicas manifestações que enchem avenidas e cidades, reflete-se também um pouco por cada paróquia e família em pesadas esperas. Esperas em que as palavras de ordem são substituídas por rezas, tudo vozes que se não chegarem a uns talvez cheguem ao Céu. Nem umas nem outras parecem, no entanto, estar a segurar aquela que costuma ser a última a desaparecer: a esperança. E, talvez pior do que isso, é não se estar a ser capaz de explicar a estas pessoas alternativas, porque esta foi a última que os foi convencendo, pelo menos à maioria que se deu ao trabalho de demonstrar que acreditava nela, votando. Que mais pedir-lhes agora?