21.6.11

As Feiras (21.06.2011)

As feiras chegam para marcar no calendário das populações uma época de ar livre, de lazer e diversão, de ver e ser visto. Vão-se modificando, elas mesmas, mas também aos olhos de quem as vai vivendo de ano para ano, de quem vai crescendo com elas. Uma espécie de silly season popular, que não sai nas revistas cor-de-rosa mas preenche sobretudo as noites de quem as frequenta ou de quem, não as frequentando, vai delas tendo relatos, apreciações e juízos, ou nela tropeça como se se tratasse de obstáculo a uma rotina que não se quer alterada. Procura-se ambiguamente a novidade e a tradição, ou simplesmente se aceita o que outros fazem para nos marcar os dias, para o bem ou para o mal, consoante se seja mais ou menos festeiro ou pacato cidadão em dias sacrificados por sons, cheiros e movimento.

A elas se colam opiniões e reacções epidérmicas, impressões e expressões, comerciais ou políticas. Há o “gosto mais ou menos do que a edição anterior”. Há o “está mais fraco ou melhor” o negócio, o que trata do ócio mas não só. Há o apropriar da feira por quem a organiza e que, normalmente, procura no sucessor um pior sucesso que aquele que foi o seu, ou do qual se apropriou. Uma espécie de guerra de mordomos de romaria que se quer sempre igual, mas maior e melhor, o que pode ser tão verificável como questionável. Até porque se há lugar por que todos passam de melhor ou pior vontade, mas nunca indiferente, em princípio, esses lugares são estas feiras anuais que se instalam no nosso caminho do dia-a-dia, tornando-se na imensa maioria das vezes completamente incontornáveis.

Neste sentido, as feiras são como lugares de afirmação de quem as cura, recebendo esse património a que se quer acrescentar mais ou diferente, deixando para a geração seguinte uma herança mais recheada. Se não é assim devia ser, digo eu. O maior e o melhor são, no entanto, barómetros que se calibram por medidas flutuantes, ao sabor mais de verbas do que de verbos de vontade e intenção. E serão sempre medidas sem mediana definida, porque o que agrada mais a uns deixa outros indiferentes e o que incomoda fulano enche as medidas a beltrano.

Ainda assim há todo um enorme esforço dispendido a vários níveis na concepção, montagem e funcionamento de uma feira como é a de São João que chega a Évora, ainda e sempre, nesta semana. Exercícios de fazer oitos com pernas de noves, nesse esforço que será sempre mais reconhecido pelas enchentes que reincidem noite após noite no bulício da festa, do que em qualquer crónica ou opinião de rádio ou jornal. 

Entre farturas, caipirinhas, cachorros e poncha, fica a memória do polvo, de cheiro intenso e de consumo limitado a dentes de leão e a quem gostasse, claro, nas estórias que se vão contando à geração seguinte, crescendo a Feira com as gentes. Uma dinâmica que veio fazer com que a geração que lhes sucede, sobretudo àquelas feiras que ocorriam mais amiúde por ano, seja a dos hipermercados e centros comerciais, aonde acorrem romagens em tudo semelhantes, e que apenas alguns, não sem algum pedante elitismo, vão recusando, acusando a descaracterização, ignorando o efeito do Tempo que passa e de quem não são nem nunca serão donos. Passear, comprar, passar o tempo, encontrar conhecidos, verbos que se conjugam da mesma maneira em cenários que se modificaram na luz, no som e nos cheiros e a que não adianta reagir sob pena de se olhar sempre o Futuro com a nuca.