19.5.11

Regras, transparência e equidade (Crónica da Rádio Diana, 10.05.2011)

Depois de tramitarem por mais do que uma reunião pública, de reuniões com os interessados e de trinta dias em que qualquer cidadão poderia sobre eles ter-se pronunciado, foram aprovados na última sessão da Assembleia Municipal de Évora os regulamentos que definem os critérios de apoio a conceder aos agentes culturais, desportivos e sociais do Concelho, aguardando-se apenas agora a sua publicação em Diário da República. São associações que apostam no desenvolvimento de actividades que revertem a favor dos seus associados ou que têm como beneficiários os cidadãos enquanto público. Todas elas, maioritariamente de carácter amador mas algumas também profissionais, contribuem para o bem-estar das populações, tendo uma função que na sua essência serve sobretudo o desenvolvimento e a coesão social.   
Foi um trabalho demorado, muito discutido entre os técnicos responsáveis pelas três áreas em questão, pois com esta regulamentação passarão a estabelecer-se contratos com as diferentes associações que terão como base um conjunto de regras comuns que se aplique a todos, ainda que respeitando as diferentes actividades que cada um se propõe desenvolver. Explicando melhor e dando apenas um exemplo: se uma associação conta como apoio municipal com a cedência de um autocarro para se deslocar numa actividade pontual ou de calendário, outra, por desenvolver nesse ano actividade que não o necessite, ou por dispor de transporte próprio, não deverá, feitas as contas finais de todo o tipo de apoio, ficar prejudicada. A cedência de qualquer apoio logístico, de equipamentos ou de serviços também tem um preço e implica o investimento de dinheiros públicos. A transparência na sua gestão, já que são bens de todos nós e cujo uso deve reverter para todos nós, é um princípio que ninguém nunca ousará pôr em causa num Estado democrático, muito embora possam ser discutíveis as decisões de investir o dinheiro público nesta ou naquela opção, esta sim politicamente assumida pelo executivo que foi eleito para o fazer. E quem o elege deve saber quanto, para quê e quem beneficiou desse investimento. 
Mas a definição dos regulamentos foi igualmente um motivo de contestação, ao abrigo de outras contestações, que enrolou numa onda mais ou menos mediática sobretudo o regulamento que passará a pautar a atribuição de apoios aos agentes culturais. Uma vez que relativamente às outras duas áreas a situação de dívida por parte do edil não era nem é diferente, apenas posso entender as manifestações em forma de artigos de jornal, entrevistas e concentração de cidadãos por uma – ou talvez duas – razões.
São os agentes culturais muito vocacionados para o desenvolvimento de actividades que resultam no espectáculo, o que requer uma reacção imediata e de preferência ruidosa de um público, desejando-se que este não seja apenas espectador mas de preferência participante, pois esta é a forma que a arte tem de, pela ficção, comprometer no acto artístico não apenas o criador, mas também o re-criador – intérprete ou actor – e o espectador, num jogo de ilusão que todos estes intervenientes sabem que o espectáculo é e do qual conhecem as regras quando começa. Esta capacidade que a arte tem de nos levar através de outras linguagens, para além da verbal que pode ou não estar presente, a um mundo de possíveis que por mero acaso se cruza com a realidade, é essa capacidade, para além do momento de lazer e evasão, que também torna a arte tão essencial e tão autêntica, pois afastando-se do real põem-no em cena e desperta emoções que nos ajudam a melhor vivê-lo.
Bom, quanto à outra razão de mais eufórica reacção a uma questão financeira durante o período em que os técnicos e os políticos responsáveis se ocupavam e preocupavam em estabelecer regras de relacionamento entre agentes e município, só posso evocá-la se olhar para algumas das partes interessadas no assunto, e falo de certos agentes culturais, como opositores políticos ao actual executivo camarário e que, aproveitando-se de forma fúngica como é aliás sua prática comum, da situação financeiramente débil em que os agentes – culturais, sociais e desportivos - tão vítimas da actual crise como qualquer outro cidadão contribuinte, se encontram, para também terem palco. É que para estas forças partidárias a Cultura é vermelha, era um monopólio seu e perdê-lo foi uma maçada. Porque é que desconfio disto? Leia-se a acta da última reunião da Assembleia Municipal de Évora e talvez concordem comigo.