6.12.22

Cantar ou sussurrar o Amanhã

 Hoje muitos de nós estamos a fazer figas para que Évora seja escolhida amanhã Capital Europeia da Cultura em 2027. Não sei se o processo da candidatura teve algum impacto na conquista de mais públicos para a cultura, ou se a comunidade directamente envolvida já estava contente com “o seu público”. Os confinamentos de 2020 e 2021 não terão ajudado, nem Évora, nem nenhuma das outras candidatas. Uma cláusula de regulamento extra que não servirá de desculpa às perdedoras e deixará à vencedora oportunidade para voltar em força ao espaço público. O que o desconfinamento de 2022 já poderia ter vindo a anunciar, talvez ainda a coberto do medo é certo. De qualquer modo, os dados, bem ou mal, estão lançados.


Um texto divulgado no final da última visita do júri à cidade dizia assim, em forma de balanço:

“Sentimos que tivemos a cidade, e o Alentejo, caminhando connosco. E acreditamos que o júri nos sentiu também.

Com a cultura ao centro, este é um projeto coletivo que se faz para as pessoas, e que não se faz sem as pessoas. Por isso, agradecemos a todas as pessoas, entidades e organismos, de Évora e de vários pontos do Alentejo, que ontem, e ao longo deste caminho que percorremos juntos, deram a sua voz à voz desta candidatura. Sozinhos sussurramos, juntos somos um coro: e ontem, fomos um coro.

Até lá, é preciso manter vivo este alento que o Alentejo contém, e continuar a acreditar, a inspirar, a partilhar, e a mobilizar, para trazer o título para Évora, e o Alentejo, como queremos.”


Este balanço em tom poético, jogando com palavras que se aproximam (como “alento” e “Alentejo”), ou que se entoam harmoniosamente (como “sozinhos sussurramos”), soou-me a que se reconhece a participação e se anuncia, surrateiramente, que se colocará aos ombros do “colectivo” o peso do resultado. A ver vamos se assim será…


Isto, bem entendido, são impressões de quem, por motivos vários, tem acompanhado o assunto com a mesma distância de uma pessoa que morando, trabalhando e pagando impostos em Évora, não é assídua frequentadora dos seus eventos culturais, ainda que atenta à agenda que divulgou os que promoveram a candidatura. Agenda que me pareceu consistente com a identidade que, sobretudo olhada de fora de Évora e do Alentejo, se tomou como consolidada: o retrato do vagar. Vinda de dentro, a apresentação parece desvalorizar o anedótico e cavalgar as queixas de uma certa contemporaneidade que se deixa enredar no vórtice da velocidade. Veremos se funcionará, sendo Évora, como espero, Capital Europeia da Cultura em 2027. Que tenhamos saúde para lá chegarmos!


Até para a semana, esperando poder voltar por bons motivos a este assunto.