Está na altura de lançar pautas e
apeteceu-me falar de exames, até a pensar nas práticas de avaliação a que,
actualmente, somos todos tão chamados a fazer para escrutinar medidas e
condicionar, com escolhas ou até mesmo com outro tipo de pressões, aqueles que
exercem cargos de gestão e direcção. O que, diga-se de passagem, testa muito
mais a resistência do que outra qualquer competência, eventualmente até mais
benéfica para aqueles e aquilo que se gere ou dirige.
Aprendi a pensar que os momentos de
avaliação são uma espécie de competição individual para a qual treinamos, mais
ou menos afincadamente, e cruzei-me várias vezes com alunos que eram muito
melhores nos treinos do que nos resultados que obtinham nas competições. Daí
que o treino seja, ao longo de um processo de construção e evolução, de facto o
principal. Não com vista ao exame, mas como verdadeira intenção de formar essas
pessoas. Talvez seja por isso que faço tudo o que está ao meu alcance para
evitar que os alunos vão a exame, preferindo que estejam nas aulas e possamos
puxar uns pelos outros.
Se também me parece óbvio agora, ao
fim de umas décadas de vida, que os resultados acontecem muito mais devido ao
trabalho do que à sorte, apesar de haver momentos de sorte, porque os há, que
também deram muito trabalho, a satisfação pessoal não se pode (numa vida tão
curta e tudo, que é o que quem se dá bem com ela nunca, nem centenário, nega)
limitar-se a um único momento. Ainda que numa vida haja o que chamamos momentos
únicos, porque também os há, mesmo não sendo realmente nem inéditos, nem
exclusivos.
O Vergílio Ferreira escreveu que «Há
o desejo, que não tem limite, e há o que se alcança, que o tem. A felicidade
consiste em fazer coincidir os dois.», o que na era da busca da felicidade a
que parece termos chegado, nesta tão rápida evolução da ciência e da técnica, e
que nos deixa tempo para pensar na melhor maneira de elas usufruirmos, me
pareceu conselho sábio. Muito até ao arrepio das igualmente actuais palavras de
estímulo que profere quem acha que tem e pode ter vocação para treinar gente
feliz, por cima de toda e qualquer circunstância. É que esse tipo de estímulo
pode mesmo ser tão exagerado que passem, os que a eles são sujeitos, para o
lado oposto, o da frustração. E nada disto, afinal, serve para melhorar o que é
o optimismo e o mais recentemente baptizado conceito de auto-estima.
Numa era em que o que podemos ter é
muito mais acessível, quando abençoados pelo deus-dinheiro, do que o que
podemos ser – basta ver como nos impingem o supérfluo com tanta facilidade e
tentam que se contorne o menos bom com a possibilidade de sermos mais felizes
com esse supérfluo, tornando-o imprescindível – resistir e viver melhor só deve
poder encontrar-se em nós mesmos e na responsabilidade pessoal que cada um de
nós, com a ajuda dos outros porque a solidariedade é que também nos permite
vivermos em sociedade, treina quando vive. A ideia do Juízo Final que as
religiões todas apregoam é esse exame final. Os métodos de treino é que não são
os mesmos, mesmo com códigos gémeos. E muitos desses métodos, como sabemos
pelas notícias que nos chegam todos os dias, são inimigos do homem e da vida em
sociedade.