«O vocabulário do amor é restrito e repetitivo, porque a sua melhor
expressão é o silêncio. Mas é deste silêncio que nasce todo o vocabulário do
mundo.» É também assim que Vergílio Ferreira pensa a expressão do Amor, esse
conceito que tem alturas do ano nos calendários coletivos ou particulares para
se celebrar. E o Natal é a quadra que o mundo ocidental de influência
judaico-cristã escolheu para comemorar o Amor (com maiúscula mesmo) e re-atualizar
o nascimento de um messias de nome Jesus.
Se me importava aproveitar a crónica de hoje para desejar um bom Natal
aos ouvintes e leitores, não deixei de achar estimulante associar aos votos da
quadra a reflexão sobre o uso – bom ou mau – das palavras e a valorização do
silêncio que Vergílio Ferreira faz, tão mais importante quanto associada a esse
universal sentimento. Esta dádiva que é ter o privilégio de que um silêncio
signifique tanto para, pelo menos, duas pessoas, que se transforme em símbolo
de uma intimidade construída na base do entendimento e da reciprocidade, só
pode também ter que ser relacionada com as trocas de presentes que, quais Reis
Magos, repetimos por esta altura. E será assim que também passámos a aplicar a
máxima do Natal ser quando um Homem quiser.
Aquilo que damos para agradar aos outros é entendido, mesmo sem palavras,
no gesto e no objeto da nossa dádiva, como um mútuo conhecimento e um
reconhecimento do que cada um representa para o outro. Sem alardes nem
ostentação, é o que tem ou o que pode ser. Um ter e um poder que, mais do que o
ruidoso embrulho de papel e laço brilhantes e coloridos, prometem uma entrega
que não é vazia mas silenciosa, e recebida assim mesmo. Um silêncio que só será
ensurdecedor para os desentendidos. E se os há, aos silêncios, dolorosos, é
porque se comunica assim a dor e se recebe resposta de quem a entende. E
entender esse silêncio é também uma prova de Amor. É nesta relação das palavras
ao silêncio que se joga não só no campo do Amor, mas no da Inteligência e das
suas diversas variantes, mas isso é assunto que está para além da quadra,
claro!
Deve ter sido a pensar nesse silêncio pacificador que o padre alemão
Joseph Mohr escreveu em 1818 a Stille Nacht
uma das canções natalícias mais ouvidas e a que a tradução mais comum para o
português interpretou como Noite Feliz.
Desejo-vos a todas e a todos um Feliz Natal!