«A coisa
nenhuma deveria ser dado um nome, pois há perigo de que esse nome a
transforme", disse Virginia Wolf nos inícios do século XX. Como estamos a
estrear um ano novinho em folha, como as palavras são uma das matérias-primas
das crónicas, como há um orçamento novo e um plano de atividades novo de um
executivo novo numa Cidade antiga que é Évora, resolvi juntar este alerta de
Virginia Wolf, e rebuscado exagero literário, a uma prática que descobri, não
sem algum tempo de reflexão, no novo governo da Cidade.
O orçamento
já está aprovado e, em princípio, porá a trabalhar como se propuseram a fazê-lo
e os eborenses, vá, a maioria dos eborenses que quis votar, escolheu, os
elementos do novo executivo municipal, que é como quem diz presidente e
vereadores. Nestes dois primeiros meses não era previsível que muito se
fizesse, ainda que afanosamente se tenham divulgado inúmeras iniciativas que, a
maioria órfã de quem as gerou, foram perfilhadas por quem se deverá encarregar
do seu destino. É normal, já que ao fim de 12 anos, haverá programas e projetos
que não poderão ter ultrapassado a fase de adolescência, o que já não
aconteceria se tivessem uma consolidação de 20 e tal anos. Mas adiante. O que
me traz hoje aqui é o aspeto inovador do plano de atividades que se propõe
começar agora e cumprir até 2017, em princípio.
E inovador
em quê, perguntar-me-ão desconfiados, com este aparente elogio vindo de
vereadora da oposição. Pois bem, o plano de atividades é inovador no uso de
palavras. Dar-vos-ei um exemplo só, para já e para não vos maçar mais, e porque
outros poderão voltar às crónicas, uma vez que visitarei o documento várias
vezes. Além de que, julgo eu que poderão consultar os outros, nos meios de
comunicação municipal, e avaliá-los em relação direta. O exemplo é de como, de
repente, o plano de atividades e o orçamento passaram a referir-se
expressamente à Câmara Municipal de Évora como Município de Évora. Com a
insistência quase que parecia que estávamos a ver as palavras a negrito, com
direito a abreviatura nova e tudo e que se pode ler MÉvr. Assim mesmo. E admito
que levei algum tempo a perceber o porquê desta nova forma de se referirem, e
presumo que desejarem que nos refiramos, à Câmara.
A CME passar a MÉvr, porquê? Eu que até acho graça, e
uso com afeto, a corruptela popular de “cambra”, fiquei mesmo a matutar no
assunto. Depois de algumas voltas aos últimos quatro anos, relembrando as
intervenções de ex-membros da oposição agora governantes ou a eles chegados, em
diferentes lugares, percebi finalmente uma possível razão. É que ao fim de 12
anos a tentarem, persistentemente, denegrir a imagem da Câmara Municipal de Évora,
até quando esta era pública, nacional e internacionalmente reconhecida, a
Câmara e não apenas a Cidade, teriam agora de se querer livrar dessa mancha que
eles próprios derramaram e rebatizar então a “coisa” com novo nome de Município
de Évora ou, na sua versão “diminutivo-nickname”, MÉvr. Pronto, aparentemente deslindada
esta curiosidade, outras haverá que trarão assunto com elas.