13.3.12

Se o velho pudesse e o novo quisesse, nada havia que não se fizesse

Abriu por estes dias o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo. Coincidiu, ou fez-se coincidir, com um balanço de notícias de mortes de idosos, em casa, sozinhos, que a Comunicação Social explorou à exaustão, com notícias diárias e que enformaram um número anormal no cômputo total de mortes este Inverno (mais 4 mil do que a média habitual). O frio mais rigoroso, o tempo seco propício à propagação de vírus foram as causas mais apontadas para o fenómeno. Não sei se me chegam estas explicações. Não as contesto, nem as ignoro, mas o meu próprio envelhecimento me leva a refletir e a encontrar uma outra explicação. Aqui há uns anos atrás, numa ida ao cinema em família para ver mais um episódio da saga do herói Indiana Jones, houve um diálogo entre o arqueólogo-aventureiro e um velho professor amigo do seu pai, em que este, olhando uma fotografia de juventude, nostálgico, dizia qualquer coisa como «há uma altura em que a vida nos dá pessoas, filhos, netos, e outra em que começa a tirar-nos as pessoas». Aquela imagem da solidão de um homem, comoveu-me quase tanto como o ar de pânico que o meu filho pôs no dia em que com 4 ou 5 anos me perguntava sobre como tinha nascido o mundo, e se ia acabar, e esse tipo de coisas simples de responder quando estamos em trânsito do jardim-de-infância para casa, e quando percebendo como todos estávamos por cá de passagem, ele me dizia muito aflito que não queria morrer, mas que também não queria ficar cá sozinho sem ninguém conhecido. Julgo que vamos começar a ter a sensação de termos mais mortos porque a população está mesmo a envelhecer e dura mais, este envelhecimento, talvez há uma década, graças aos progressos da Ciência, pelo que há uma espécie de “leva” ou “stock” de prazos de validade que começa a chegar por agora ao mesmo tempo. Aquilo que acontece a um indivíduo, a quem numa determinada altura há mais gente mais velha do que mais nova que o rodeia, acontece a uma comunidade que prolonga a vida, mas não a renova com mais nascimentos. Claro que estas notícias de gente que morre sozinha em casa poderiam confrontar-se com o outro tipo de reportagens em que aos idosos em lares se lhes pergunta insistentemente se não preferiam estar nas suas casinhas do que num lugar em que parece que a companhia não é importante, mas antes o facto de ser uma última morada transitória antes do fim. Nada disto são assuntos fáceis de ouvir e de falar, mas o que é certo é que há cada vez mais programas de ocupação de idosos que se agrupam e que fazem do convívio entre eles momentos cheios de vida e alegria. E também é verdade que, envelhecendo nós de forma mais saudável, natural é que permaneçamos nas nossas casas enquanto o pudermos fazer de forma autónoma e sem precisar que haja quem tome conta de nós. Aquilo que fazemos com um idoso ou idosa é aquilo que todos deveríamos fazer uns com os outros: o convívio, a entreajuda, o civismo que uma educação permite a quem tem oportunidade de a ter. Sem intromissões mas com disponibilidade, respeitando os espaços e os tempos de cada um. E tudo isto será mais fácil se as gerações conviverem entre si. Daí que feliz me parece que este seja também o Ano em que, na velha Europa, se realce a Solidariedade entre Gerações. Sem que o alarme de reportagens sensacionais, que nos mantêm ainda assim a par do que vai acontecendo, sem que nos toldem o rumo de nos dirigirmos para uma sociedade compatível com o novo ritmo da Vida, está nas mãos de todos a prática dessa solidariedade. Entre o que se pode fazer e o que se quer fazer, está mais uma vez nas mãos dos cidadãos e da iniciativa civil começar a construir a mudança. Entre os recursos e medidas dos poderes públicos e das iniciativas particulares à disposição dos cidadãos, e a sua própria formação e consciência, ajeitam-se as pessoas, as famílias, as comunidades e a sociedade a uma nova maneira de encarar a vida que, quase a um ritmo alucinante, nos confronta com inovações e alterações que nos apanham de surpresa. Como diz o provérbio «Se o velho pudesse e o novo quisesse, nada havia que não se fizesse».